quinta-feira, 23 de maio de 2013

Racismo Não





Juiz anula editais racistas do MincJaner
Cristaldo

quarta-feira, maio 23, 2013
Em outubro do ano passado, comentei antecipadamente uma decisão racista de Marta Suplicy, ministra da Cultura. Na ocasião, em comemoração do Dia da Consciência Negra (20 de novembro), a ministra lançou editais para beneficiar apenas produtores e criadores negros. "É para negros serem prestigiados na criação, e não apenas na temática. É para premiar o criador negro, seja como ator, seja como diretor ou como dançarino", disse então a ministra à Folha de São Paulo.

Curiosamente, a decisão foi tomada em reunião em Brasília com a ministra Luiza Bairros, da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial. Estranha igualdade racial que exclui brancos e mulatos da participação nos editais. Para Nuno Coelho de Alcântara, da Fundação Cultural Palmares, instituição ligada ao MinC para promover e preservar a cultura afro-brasileira, um edital que condicione a seleção à raça do criador ou produtor pode "fomentar o preconceito racial".

Alcântara foi modesto. Pode fomentar o preconceito racial? Não é que possa fomentar. É claro que fomenta o preconceito racial. Como desde há muito vem fomentando – não o preconceito racial, mas o ódio racial – a política de cotas na universidade. Qual branco vai olhar com carinho um negro que lhe roubou a vaga na universidade só porque sua pele é negra?

Nesta segunda-feira, a Justiça Federal do Maranhão suspendeu os editais de Dona Marta, por entender que eles representam uma prática racista. Com um valor total de R$ 9 milhões, os editais foram, até agora, a principal novidade da gestão de Marta Suplicy à frente da pasta, que assumiu há cerca de nove meses prometendo políticas de inclusão.

Os editais suspensos foram: Apoio para Curta-Metragem — Curta Afirmativo: Protagonismo da Juventude Negra na Produção Audiovisual; Prêmio Funarte de Arte Negra; Apoio de Coedição de Livros de Autores Negros; e Apoio a Pesquisadores Negros. O primeiro é de gestão da Secretaria do Audiovisual (SAv) do MinC, o segundo, da Funarte, e os dois últimos, da Fundação Biblioteca Nacional. A afrodescendentada chiou:
— O racismo no Brasil em relação ao negro é uma questão histórica — avalia Antonio Costa Neto, assistente técnico do IARA. — Houve racismo durante a escravidão, posteriormente com a teoria de branquear a população e depois como política pública na educação e também na imigração. Então hoje tentamos desconstruir o racismo através de políticas públicas afirmativas. O magistrado leva em consideração o momento atual, que não admite prática de racismo, mas deve considerar também esses fatos históricos. Se fizermos um recorte racial, há poucos produtores negros com acesso a essas política públicas.
Os negros sempre apelam à escravidão, instituição abolida há mais de século no país, como se até hoje fossem escravos. Da abolição para cá, nunca tivemos, no Brasil, leis proibindo a negros qualquer direito. As chamadas leis Jim Crow, declaradas inconstitucionais pela Suprema Corte americana em 1954, constituíram a partir de 1880 a base legal da discriminação contra negros nos Estados do Sul, proibindo até mesmo um estudante passar um livro escolar a outro que não fosse da mesma raça.

No Alabama, nenhum hospital podia contratar uma enfermeira branca se nele estivesse sendo tratado um negro. As estações de ônibus tinham de ter salas de espera e guichês de bilhetes separados para cada raça. Os ônibus tinham assentos também separados. E os restaurantes deveriam providenciar separações de pelo menos sete pés de altura para negros e brancos.

No Arizona, eram nulos casamento de qualquer pessoa de sangue caucasiano com outras de sangue negro, mongol, malaio ou hindu. Na Florida, proibia-se o casamento de brancos com negros, mesmo descendentes de quarta geração. Neste mesmo Estado, quando um negro compartilhasse por uma noite o mesmo quarto que uma mulher branca, ambos seriam punidos com prisão que não deveria exceder 12 meses e multa até 500 dólares. Na Geórgia, cerveja ou vinho tinham de ser vendidos exclusivamente a brancos ou a negros, mas jamais às duas raças no mesmo local. No Mississipi, mesmo as prisões tinham refeitórios e dormitórios separados para prisioneiros de cada raça. No Texas, cabia ao Estado providenciar escolas para crianças brancas e para negras. As leis Jim Crow explicam a mauvaise conscience ianque, que se traduziu na ação afirmativa.

Nada disso existiu no Brasil no século passado. Que os negros egressos da escravidão tenham tido dificuldades para entrar no mercado de trabalho, entende-se. Tinham escassa ou nenhuma instrução e, de início, o estigma da escravatura ainda imperava. Nada disso ocorre mais. Negro não é impedido de ocupar nenhum cargo e mais: um dos personagens hoje mais celebrado pela imprensa e até mesmo cotado para a Presidência da República é um negro racista, autoritário e desbocado.

Há horas venho afirmando. Os antigos profissionais da luta de classes, ao perderem a antiga bandeira, precisavam de uma nova. Se hoje se tornou obsoleto falar em burguesia e proletariado, cria-se uma cisão entre brancos e negros, homens e mulheres, heterossexuais e homossexuais. Se não existe ódio entre uns e outros, é preciso criá-lo. Luta de classes morta, luta racial posta.

Comentaristas desinformados, que parecem não ler jornais, disseram então que Dona Marta estava oficializando o racismo no Brasil.
Nada disso! O racismo foi oficializado dia 26 de abril daquele ano, seis meses antes dos editais do Minc, quando a suprema corte judiciária do país o legalizou, por unanimidade, no país. Naquela data, o STF revogou, com a tranqüilidade dos justos, o art. 5º da Constituição Federal, segundo o qual todos são iguais perante a lei sem distinção de qualquer natureza. A partir de então, tornou-se legal a prática perversa instituída por várias universidades, de considerar que negros valem mais do que um branco na hora do vestibular. Parafraseando Pessoa: constituições são papéis pintados com tinta. Que podem ser rasgados ao sabor das ideologias.

Os considerandos a favor do racismo são vários. Segundo o ministro Cezar Peluso, “há graves e conhecidas barreiras institucionais do acesso aos negros às fontes da educação”. Como se não houvesse barreiras institucionais também para os brancos. Se o vestibular barra negros, barra também brancos, amarelos, verdes ou azuis. “É preciso desfazer a injustiça histórica de que os negros são vítimas no Brasil”, continuou o ministro. Como se os milhões de brancos que vivem na miséria não fossem vítimas de injustiças históricas.
Segundo a decisão do juiz José Carlos do Vale Madeira, da 5ª Vara Federal do Maranhão, o ministério "não poderia excluir sumariamente as demais etnias" de seus editais e determinou "a imediata sustação de todo e qualquer ato de execução dos concursos que estejam relacionados" a eles. V Ainda segundo a decisão, a criação de editais para criadores e produtores negros "não pode servir de pretexto para a estruturação estatal de guetos culturais, que provoquem, por intermédio de ações com o timbre da exclusividade, o isolamento dos negros, colocando-os em compartimentos segregacionistas".

Finalmente uma decisão sensata oriunda da Justiça, depois que o STF rasgou serenamente a Constituição. O juiz maranhense será devidamente anatematizado como racista. Aliás, já o foi – indiretamente – pela ministra da Cultura. Que deve recorrer. E o recurso cairá forçosamente nas mãos dos senhores ministros que instituíram legalmente o racismo no Brasil no ano passado.

Janer Cristaldo
Cristaldo é jornalista, escritor e tradutor e vive em São Paulo....

Assine a newsletter do Baguete
Baguete Jornalismo Digital | Todos os direitos reservados - Notas Legais | Versão mobile

Nenhum comentário:

Postar um comentário

opinião e a liberdade de expressão

Manoel Messias Pereira

Manoel Messias Pereira
perfil

Pesquisar este blog

Seguidores

Arquivo do blog