segunda-feira, 11 de novembro de 2013

Cruz e Souza, Bashô, Trótski e Jesus pelo olhar pop de Leminski



Cruz e Sousa, Bashô, Trótski e Jesus pelo olhar pop de Leminski
Sucesso de Toda Poesia mostrou que havia um grande público ávido pela sua literatura, que vinha sendo procurada há mais de uma década nos sebos


Hagamenon Brito
hagamenon.brito@redebahia.com.br

O sucesso da antologia Toda Poesia, de Paulo Leminski (1944-1989), é um dos acontecimentos editoriais brasileiros da temporada 2013. Lançado em fevereiro e reunindo, pela primeira vez, 600 poemas do poeta curitibano, se tornou o primeiro livro de poesia a entrar e atingir o topo de todas as listas de best-sellers do país: Veja, Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo, Época e O Globo.

Com mais de 50 mil exemplares vendidos e chegando a desbancar a longa supremacia da saga erótica Cinquenta Tons de Cinza (E.L. James), o sucesso de Toda Poesia mostrou que havia um grande público ávido pela literatura de Paulo Leminski, que estava fora de catálogo e vinha sendo procurada há mais de uma década nos sebos.

Vida
Também há muitos anos fora do mercado, quatro minibiografias que Leminski escreveu ao longo da década de 1980 para a Coleção Encanto Radical, da editora Brasiliense, voltam às livrarias para alegria dos fãs do poeta
mais pop do Brasil.

Vida (Companhia das Letras, R$ 46/impresso, R$ 32/e-book, 392 páginas) agrupa as biografias do poeta catarinense Cruz e Sousa, do escritor japonês Bashô, do líder religioso judeu Jesus Cristo e do político e intelectual russo Leon Trótski. Elas foram publicadas pela primeira vez em volume único, em 1990, pela Sulina.

Paulo Leminski (1944-1989) foi poeta, romancista, tradutor, compositor, biógrafo e faixa preta de judô

Aparentemente, o que teriam em comum tais personalidades e Leminski, um intelectual profundo que era capaz também de ser faixa preta de judô e coautor com Moraes Moreira de hits musicais como Promessas Demais, Mancha de Dendê Não Sai e Baile no Meu Coração?

“Por incrível que pareça, havia um pouco de Cruz e Sousa, Bashô, Jesus Cristo e Trótski em Leminski. E dele neles”, afirma o escritor e jornalista mineiro Ruy Castro, 65, autor de ótimas biografias de Nelson Rodrigues (O Anjo Pornográfico/1992) e Garrincha (Estrela Solitária/1995).

Em um depoimento de 1985, Paulo Leminski explicou seu fascínio pelos quatro biografados: “A vida se manifesta, de repente, sob a forma de Trótski, ou de Bashô, ou de Cruz e Sousa, ou de Jesus. Quero homenagear a grandeza da vida em todos esses momentos”.

Banzo e blues  Os reverenciados do poeta, seus heróis de luta e vida, não têm seus feitos narrados de modo linear ou tradicional. Os textos, na verdade, parecem ensaios pop, cheios de estilo em que detalhes de Cruz e Sousa (que usou a palavra tropicalismo quase 70 anos antes de Caetano, Gilberto Gil & cia), Bashô, Trótski e Jesus se misturam com opiniões reveladoras do próprio biógrafo.

Para Leminski, Trótski foi um homem de letras, autor do “mais extraordinário livro sobre literatura já escrito por um político”: Literatura e Revolução (1922/1923). Cruz e Sousa é protagonista de um movimento que Leminski chama de underground e que muito o influenciaria: o simbolismo.

Dedicada a Gilberto Gil ("Pai de santo, guru, sensei, mestre zen, brilho do Terceiro Mundo, mimo de todos os orixás"), a biografia do "negro branco" Cruz e Souza cria pontes entre sentimentos, arte e religiosidade de negros afro-brasileiros e afro-americanos.

Ao comparar as influências e adaptações dos escravos no Brasil e nos EUA, por exemplo, Leminski escreve que aqui o negro “conseguiu preservar suas formas culturais, em corpo e alma, da lavagem cerebral exercida por missionários e pregadores”.
Em Salvador, o terreiro Ilê Axé Opô Afonjá representaria o “segredo da sobrevivência da cultura negra, da alma negra, raiz de toda a criatividade baiana”.

Nos EUA, porém, a resistência negra foi quebrada pela pressão da cultura dos senhores brancos. O protestantismo, com sua “religião despojada, antissensorial, não permitiu aos negros americanos o emprego da estratégia de sincretismo que seus irmãos usaram no Brasil, golpe de mestre na capoeira cultural. Só a música negra conseguiu sobreviver nos EUA com um vigor extraordinário, influenciando toda a música moderna”.

Bashô, pai do haicai, forma poética que valoriza a objetividade e que Leminski tanto amava, é “o poeta máximo que o Japão produziu”. E Jesus é descrito como “um momento de significação ininterrupta: um signo de leitura infinita”.


Familiares proíbem reedição de biografia do poeta paranaense

Esgotado no mercado, o livro Paulo Leminski - O Bandido que Sabia Latim (Record, 378 páginas), escrito pelo jornalista e escritor Toninho Vaz, não poderá ser publicado de novo. A poeta e viúva de Leminski, Alice Ruiz, e suas filhas, Estrela e Aurea, proibiram em outubro a quarta edição da obra que foi publicada pela primeira vez em 2001.

Na época, Alice, que não teve participação nos direitos autorais, autorização para a publicação. O motivo da proibição agora foi uma alteração em relação às edições anteriores: um parágrafo de oito linhas contendo um relato em primeira pessoa de um morador da mesma pensão onde Pedro Leminski, irmão de Paulo, foi encontrado morto. A descrição do suicídio ocorrido em 1986 não agradou à família de Leminski, que enviou uma carta - redigida à mão - barrando a publicação que deveria ter sido lançada no final de outubro pela editora Nossa Cultura, de Curitiba.

O jornalista Toninho Voz entrou com uma interpelação judicial no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro exigindo esclarecimentos à família de Leminski, que alegou “enfoque depreciativo à imagem do biografado e familiares”. Vaz, que era amigo de Paulo Leminski, teve que devolver à editora a verba de adiantamento que havia recebido pela publicação da biografia.


 


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Manoel Messias Pereira

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