terça-feira, 12 de novembro de 2013

O Apartheid na Câmara dos Deputados


Assuntos relacionados: apatheid, câmara dos deputados, gilberto carvalho, parlamento, dilma rousseff, direto da redação
"Direto da Redação": O apartheid entre nós

Um grande equívoco avança na nossa Câmara dos Deputados...




O apartheid, termo africâner que quer dizer separação, surgiu oficialmente na África do Sul em 1944, e serviu para designar a política de segregação racial e de organização territorial aplicada de forma sistemática a aquele país, durou até 1990.

O objetivo do apartheid era separar as raças no terreno jurídico (brancos, asiáticos, mestiços ou coloured, bantus ou negros), estabelecendo uma hierarquia em que a raça branca dominava o resto da população e, no plano geográfico, mediante a criação forçada de territórios reservados: os Bantustanes.

Até mesmo no parlamento vigorava o apartheid sul-africano, negros tinham a sua cota na assembleia.

Em 1959, com o ato de autogoverno, o apartheid alcançou o sua plenitude quando sua população negra ficou relegada a pequenos territórios marginais, autônomos e privados da cidadania sul africana.

Isso tudo vem a propósito do grande equívoco que avança na nossa Câmara dos Deputados. A Comissão de Constituição e Justiça aprovou  proposta de emenda constitucional (PEC) que institui reserva de vagas de deputados federais, estaduais e vereadores para candidatos que se declararem negros ou pardos. Pelo projeto, o número de vagas em cada eleição para esses concorrentes deverá corresponder a dois terços de pretos e pardos computados no último censo demográfico realizado pelo IBGE. Mas o total não poderá ser inferior a um quinto das cadeiras do parlamento nem maior que a metade mais uma das vagas.

Se estivesse em vigor, essa regra exigiria que a atual legislatura contasse com pelo menos 100 negros ou pardos para o total de 513 parlamentares. É certo que a CCJ examina apenas a admissibilidade constitucional do projeto, que ainda tem longo caminho pela frente na Câmara e no Senado. Mas a sua tramitação precisa desde já ser levada a sério, para que se impeça o país de alimentar uma iniciativa demagógica, injusta e inconveniente.

Claro, aqui e ali figuras públicas defendem essa excrescência embora revestida da aparente boa intenção de produzir mais uma forma de inclusão social e de remissão dos pecados originais da escravidão, em tese extinta no fim do século 19.

O texto parte do raciocínio de que, se 50,7% dos brasileiros se declaram negros ou pardos, conforme o censo de 2010, a representação dessa parcela da população na Câmara estaria distorcida,  hoje essa bancada não passa de 10% do plenário.

No Brasil, ninguém é proibido pela cor da pele de se candidatar a qualquer cargo público. Nada impede o eleitor de votar em candidatos de qualquer cor ou ascendência.

Se há proporcionalmente menos negros e pardos nos parlamentos brasileiros, isso é apenas o reflexo de nossas desigualdades sociais. Mas não por atalhos como o da reserva de cotas no Legislativo. Essa proposta demagógica  é exatamente o tipo de alternativa que mascara a realidade.  Não estamos avançando. Mas, sim, evitando encarar a verdadeira solução, que passa obrigatoriamente pelo acesso amplo à educação de qualidade e a reformas estruturais de nosso país.

Essa PEC não une a sociedade, e ajuda a criar adversários, pretos contra brancos, patrões contra empregados, homens contra mulheres, crentes contra ateus,  situações que só interessam a quem pretende dividir para comandar. É inconveniente, dá guarida ao erro dos que defendem a valorização das diferenças, em vez da ampliação das igualdades, esse, sim, o caminho verdadeiramente democrático de construção de uma sociedade mais justa.

Nestes dias, o ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, perdeu uma excelente oportunidade de ficar calado quando afirmou que a sociedade brasileira já amadureceu a ponto de reconhecer a importância das cotas. Esse comentário foi feito um dia após a presidente Dilma Rousseff anunciar que vai encaminhar ao Congresso Nacional projeto de lei que reserva a negros 20% das vagas oferecidas em concursos públicos da administração federal. A proposta tramitará em regime de urgência. Dilma assinou  decreto que regulamenta o Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial e anunciou a criação de uma instância específica no Ministério da Saúde para atender a população afrodescendente.

A fala de Carvalho aconteceu após participar de um painel de discussão na 3ª Conferência Nacional de Promoção da Igualdade Racial, em Brasília.


 

 Jornalista,  Henrique Veltman
editor de Política


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Manoel Messias Pereira

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