Texto do anarquista Roberto Freire
CRÔNICA DE AMOR
Roberto Freire*
Você ama aquela petulante. Você escreveu dúzias de cartas que ela não respondeu, você deu flores que ela deixou a seco, você levou para conhecer a sua mãe e ela foi de blusa transparente. Você gosta de rock e ela de chorinho, você gosta de praia e ela tem alergia a sol, você abomina o Natal e ela detesta o Ano Novo, nem no ódio vocês combinam. Então?
Então que ela tem um jeito de sorrir que o deixa imobilizado, o beijo dela é mais viciante do que LSD, você adora brigar com ela e ela adora implicar com você. Isso tem nome.
Você ama aquele cafajeste. Ele diz que vai ligar e não liga, ele veste o primeiro trapo que encontra no armário, ele escuta Egberto Gismonti e Sivuca. Ele não emplaca uma semana nos empregos, está sempre duro, e é meio galinha. Ele não tem a menor vocação para príncipe encantado, e ainda assim você não consegue despachá-lo. Quando a mão dele toca sua nuca, você derrete feito manteiga. Ele toca gaita de boca, adora animais e escreve poemas. Por que você ama este cara? Não pergunte pra mim.
Você é inteligente. Lê livros, revistas, jornais. Gosta dos filmes de Woody Allen, dos irmãos Cohen e do Robert Altman, mas sabe que uma boa comédia romântica também tem seu valor. É bonita. Seu cabelo nasceu para ser sacudido num comercial de xampu e seu corpo tem todas as curvas no lugar. Independente, emprego fixo, bom saldo no banco. Gosta de viajar, de música, tem loucura por computador e seu fettuccine ao pesto é imbatível. Você tem bom humor, não pega no pé de ninguém e adora sexo. Com um currículo desses, criatura, por que diabo está sem um amor?
Ah, o amor, essa raposa. Quem dera o amor não fosse um sentimento, mas uma equação matemática: eu linda + você inteligente = dois apaixonados. Não funciona assim. Ninguém ama outra pessoa pelas qualidades que ela tem, caso contrário os honestos, simpáticos e não fumantes teriam uma fila de pretendentes batendo à porta. O amor não é chegado a fazer contas, não obedece a razão. O verdadeiro amor acontece por empatia, por magnetismo, por conjunção estelar. Costuma ser despertado mais pelas flechas do cupido do que por uma ficha limpa. Ninguém ama outra pessoa porque ela é educada, veste-se bem e é fã do Caetano. Isso são só referências.
Ama-se pelo cheiro, pelo mistério, pela paz que o outro lhe dá, ou pelo tormento que provoca. Ama-se pelo tom de voz, pela maneira que os olhos piscam, pela fragilidade que se revela quando menos se espera. Amar não requer conhecimento prévio nem consulta ao SPC. Ama-se justamente pelo que o amor tem de indefinível. Honestos existem aos milhares, generosos tem às pencas, bons motoristas e bons pais de família, tá assim, ó.
Mas ninguém consegue ser do jeito que o amor da sua vida é…
Isto é amor.
*Roberto Freire (São Paulo, 18 de janeiro de 1927 — São Paulo, 23 de maio de 2008) foi um médico psiquiatra e escritor brasileiro, conhecido por ser o criador de uma nova e heterodoxa técnica terapêutica denominada Soma (somaterapia). Foi também diretor de cinema e teatro, autor de telenovela, letrista e pesquisador científico.
Lara Fabian
poema de Arnaldo Antunes
As coisas têm peso,
massa, volume, tama-
nho, tempo, forma, cor,
posição, textura, dura-
ção, densidade, cheiro,
valor, consistência, pro-
fundidade, contorno,
temperatura, função,
aparência, preço, desti-
no, idade, sentido. As
coisas não têm paz.
Arnaldo Antunes
Marisa Monte
Poesia de Manoel Messias Pereira
o que é humano
humano
é construir socialmente
a cultura do tempo,
tempo de indisciplina
de rasgar as expectativas
de derrubar fronteiras
de incendiar barreiras,
tempo de mudar
muito além das placas
de construções políticas
do sistema capitalista.
É tempo de misturar os gêneros
da interabilidade e a citacionalidade
tempo de derrubar os altares
de estabelecer as bandeiras
vermelhas, com a foice e o martelo
em todo o território nacional,
é tempo de cantar a internacional
e deixar pulsar
a solidariedade
a internacionalidade
e o grito da liberdade
na ternura da beleza
mas da extrema beleza universal.
Manoel Messias Pereira
poeta
São José do Rio Preto - SP
Natalie Cardone
humano
é construir socialmente
a cultura do tempo,
tempo de indisciplina
de rasgar as expectativas
de derrubar fronteiras
de incendiar barreiras,
tempo de mudar
muito além das placas
de construções políticas
do sistema capitalista.
É tempo de misturar os gêneros
da interabilidade e a citacionalidade
tempo de derrubar os altares
de estabelecer as bandeiras
vermelhas, com a foice e o martelo
em todo o território nacional,
é tempo de cantar a internacional
e deixar pulsar
a solidariedade
a internacionalidade
e o grito da liberdade
na ternura da beleza
mas da extrema beleza universal.
Manoel Messias Pereira
poeta
São José do Rio Preto - SP
Natalie Cardone
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