quarta-feira, 8 de maio de 2013

A questão agrária no Brasil





A questão agrária no Brasil
 

DIÁRIO DA MANHÃ
ANTÔNIO LOPES
“Esta cova em que estás com palmos medida, é a conta menor que tiraste em vida, é de bom tamanho nem largo nem fundo é a parte que te cabe deste latifúndio. Não é cova grande, é cova medida, é a terra que querias ver dividida.”

(Funeral de um lavrador,

Chico Buarque)

No viés político, questão agrária é concentração da propriedade da terra, desenvolvimento das forças produtivas e influência do poder político.

Na Sociologia, o termo explica as relações sociais na organização da produção agrícola. A Geografia explica a forma de apropriação da utilização do principal bem da natureza, a terra. Em História, a evolução da luta política, de classes e domínio e controle da posse da terra.

A questão agrária é ainda o conjunto de interpretações e análises que explicam a posse, propriedade, uso e utilização desta mercadoria capitalista.

Estudos referentes ao assunto são recentes no Brasil, após 400 anos de colonização, surge a primeira universidade, em 1903, a Cândido de Menezes, filha do ideal Iluminista que após 1922, com o evento da Semana de Arte Moderna, destaca necessidade de um pensamento brasileiro dedicado às Artes, Cultura e Ciência.

O período colonial de 400 anos representa ainda a carência e ignorância quanto às questões agrárias no País. Bibliografias agrárias datam da década de 1960 no Brasil por necessidade política e sociológica de partidos políticos. Antes disso, estudos eram de caráter econômico, tendo em Roberto Simonsen, titular da USP, intelectual das elites industriais sua maior expressão. Ele defendia a tese do predomínio das relações de produção capitalista no desenvolvimento da produção capitalista no desenvolvimento da agricultura brasileira.

Na década de 1970, estudos publicados sobre esta evolução agrária no Brasil, destacam interpretação quase consensual sobre a evolução da posse, propriedade e uso da terra, desde a colonização.

No período que compreende 50 mil a.C. a 1500 d.C. a corrente hegemônica da evolução da questão agrária traz etapas de formações históricas. (Darcy Ribeiro, Editora Civilização Brasileira).

Correntes migratórias asiáticas cruzam o Alaska e ocupam o continente americano. No Brasil, a presença humana é datada de 50 mil anos atrás, segundo vestígios encontrados no Estado do Piauí.

Desde 1500 d.C populações divididas em agrupamentos sociais, famílias, tribos, clãs, em sua maioria nômades, dedicavam-se à caça, pesca, extração de frutas. A natureza era pródiga em frutos e alimentos de primeira necessidade. Essas tribos cultivavam o milho, de origem das Américas Andina e Central, constatando para a Ciência, o intercâmbio entre estes povos.

Esses povos viviam o comunismo primitivo, organizado segundo parentesco, idioma, etnia e cultura. Não havia ainda conceito de propriedade. Os bens da natureza eram coletivos e atendiam, única e exclusivamente às necessidades de sobrevivência social. Nômades, deslocavam-se o tempo todo.

Segundo Darcy Ribeiro, no livro O Povo Brasileiro, colonizadores europeus invadiram o território, dotado de cerca de 300 grupos tribais e cerca de 5 milhões de pessoas.

De 1500 a 1850, o período inicia-se com a chegada, ao território, de missões árabes, africanas, fenícias, europeias e a “descoberta “ de Cristóvão Colombo, em 1492. Nesta época a reforma agrária não era ainda tema que se sobrepunha à questão histórica.

Portugueses financiados pelo capital europeu invadiram o território brasileiro, usando das supremacias econômica e militar, aqui escravizaram e impuseram leis e políticas da Monarquia portuguesa.

Suas táticas de imposição eram cooptação e repressão, com os quais submeteram povos e seu modo de produção a leis e culturas importadas do continente europeu. Com a invasão dos europeus, a organização, produção e apropriação dos bens da natureza, sob a égide do sistema capitalista comprometido com o envio de matéria-prima à metrópole europeia e a obtenção do lucro e acumulação de capital a qualquer custo.

Ouro, ferro e prata, de início e logo após, a “descoberta “ da fertilidade da terra. Impuseram culturas da cana-de-açúcar, algodão, gado, café e pimenta do reino. Aproveitaram algumas nativas com o tabaco e cacau, destinadas, em larga escala, ao mercado consumidor europeu. Esse modelo foi nominado por historiadores, modelo agroexportador que em meados do século XIX, exportava 80% de tudo que se produzia no País.

Este modelo era conhecido como “plantation “, fazendas de áreas contínuas, caracterizadas pela monocultura de gado, cacau, algodão ou cana-de açúcar, destinada à exportação, tocada pela mão-de-obra escrava, próximas aos portos. Aos trabalhadores eram disponibilizados bens de subsistência e oficinas de reparo dos instrumentos de trabalho.

À Coroa, Monarquia, cabia o monopólio da terra. Mais tarde, devido à necessidade premente de investimentos de capital estrangeiro, a Coroa destina a concessão de uso com direito à herança, de enormes extensões de terra, medidas em léguas. Uso e concessão de direito hereditário que até então ainda não caracterizava a propriedade privada, a terra como mercadoria.

De 1850 a 1930 a necessidade de substituir a mão-de-obra escrava pelo trabalho assalariado faz surgir a primeira Lei de Terras Nº 601/1850, adequando o sistema econômico à crise do trabalho escravo que já era latente. Esta lei muda a caracterização da terra – bem da natureza – em bem de valor econômico-político.

Qualquer cidadão poderia se transformar em proprietário de terras, transformando sua concessão em propriedade privada. Para isso, deveria recolher determinado valor à Coroa. A Lei Nº 601,/1850 foi o Batistério do Latifúndio no País. Processo legal que fundamenta a injustiça na propriedade e distribuição de terras no Brasil.

Trabalhadores escravizados se revoltam no País por melhores condições de vida e trabalho. Multiplicam-se os Quilombos, tema de grande questão entre partidos e elites.

Filhos de brancos da classe média urbana os ajudavam a rebelar e fugir e, em 1888, acontece a Promulgação da Lei Áurea, que promoveu a abolição da escravatura no último País ocidental que ainda a utilizava enquanto categoria dotada para mão-de-obra barata e escravizada.

Este processo caminha até os dias de hoje no Brasil quando dos debates entre proprietários de grandes extensões de terras que defendem o seu direito absoluto na propriedade de terras.

A promulgação da Lei Áurea coloca no mercado mais de 2 milhões de escravos que invadem as cidades na condição de “cidadãos livres “ para o mercado de trabalho. Pela mesma lei foram impedidos de construir moradias nos melhores terrenos, dirigindo-se então aos morros e manguezais – o resto dos interesses capitalistas no perímetro urbano.

A Lei de Terras é também a mãe das favelas nas cidades brasileiras. Com ela chega também ao fim o sistema “plantation “ de exploração de terras. A última cartada em cima do modelo agroexportador brasileiro, à época, foi a eclosão da Primeira Guerra Mundial que durou entre 1914 e 1918, resultando na interrupção do comércio entre Américas e Europa..

Mas o continente europeu trabalha a propaganda na atração de camponeses pobres excluídos pelo avanço do capitalismo industrial no fim do século XIX.

Como promessa de Eldorado com terras férteis e baratas, a Coroa portuguesa atrai para o Brasil 1,6 milhão de camponeses pobres da Europa, praticamente o número de escravos “libertados “ no País.

Estes migrantes ocupam o Sul, que dispunha-lhes lotes de 25 a 50 hectares. Parte se dirige a São Paulo e Rio de Janeiro, sem terras, destinados a trabalhar em fazendas de café sob regime de Colonato.

Os camponeses colonos que receberam terras no Sul do País, pagaram por elas e devido à necessidade de angariara capital, ingressaram rapidamente no processo de produção para o mercado.

Já no regime de Colonato os camponeses recebiam a lavoura de café implantada pelos escravos, uma casa, e direito de usar cerca de 2 hectares por família para cultivo de subsistência, além de criar pequenos animais. As famílias, italianas e espanholas, pagavam, em produto, pela dívida contraída conforme o número de pés de café que exploravam.

O modelo de produção “plantation “ foi um verdadeiro genocídio do povo brasileiro. O massacre de indígenas e negros pode ser contabilizado pela população de 5 milhões de brasileiros, já em 1500, que após a 'importação' de milhões de escravos africanos durante o período de 350 anos de exploração, contava com os mesmos 5 milhões de habitantes, ou menos.

O surgimento do Campesinato trouxe cerca de 2 milhões de camponeses europeus para habitar Sudeste e Sul do País, 400 anos de colonização, miscigenação entre índios, brancos e negros, população esta que passou a migrar para o interior do País dedicando então à cultura de subsistência.

Ocupação que se deu pelos viéses individual e coletivo e caracterizou o surgimento do camponês brasileiro, apelidado de sertanejo, ocupando os territórios do Nordeste, Minas Gerais e Goiás.

Entre 1930 e 1964 aparece a crise política e institucional no País, influenciada pela crise no modelo exportador, afetando elites abastadas, classes hegemônicas.

Cai a Monarquia e estabelece-se então a República, através de golpe militar estabelecido pelo próprio Exército monárquico. Surge também o Movimento Tenentista, liderado por Luiz Carlos Prestes – a Coluna Prestes. Setores da burguesia industrial dão um golpe e impõem novo modelo econômico para o Brasil. Sem rompimento com países centrais e a oligarquia rural, gera o aparecimento de novas elites dominantes.

Este período é chamado desenvolvimentista, da Era Vargas, que governou o País entre 1930 e 1945. Este processo caracteriza a subordinação da agricultura à indústria.

A burguesia industrial toma o poder e origina-se a oligarquia rural brasileira, de acumulação, exportadora de café e açúcar.

Dá-se a importação de máquinas, devido a continuidade das exportações agrícolas, o chamado sistema capitalista dependente, vinculado à indústria produtora de insumo, à agricultura e surge a implantação da indústria de beneficiamento de produtos agrícolas.

Grandes proprietários modernizam a exploração agrícola e a destinam ao mercado interno. Nasce o cultivo do trigo no Sul, além da cana-de-açúcar, café, algodão.

Camponeses passam a exercer funções claramente determinadas: fornecer mão-de-obra barata. Seus filhos buscam as cidades em busca de empregos e salários nas indústrias. Praticamente todas as famílias camponesas enviaram seus filhos para as cidades, no Sul e Sudeste do País para trabalharem em fábricas.

O êxodo camponês tem o papel específico e claro de dispor mão-de-obra barata para as indústrias nas cidades. Surge o exército industrial de reserva, a baixos salários.

O Estado administrava preços até os produtos chegarem às cidades. Este processo caracteriza a alta obtenção de lucros e até hoje esta correlação entre cesta-básica e salários move a indústria nacional, cujos pagamentos são fixados pelo salário mínimo.

Camponeses foram induzidos a produzir então, matérias-primas para as indústrias: carvão, celulose, lenha, etc. Na estrutura da propriedade, a lógica contraditória da terra se repetia, produtores camponeses migravam para as cidades, transformando-se em operários.

Nascida nos latifúndios, a propriedade da terra reproduz a lógica capitalista de concentração de renda.

Em 1960 a agricultura apresenta-se modernizada e o setor camponês é totalmente subordinado aos interesses do capital industrial. Entre 1960 e 1964, a primeira crise cíclica do modelo dependente.

Mobilizações sociais, disputas entre classes, elites, a busca de saídas para a acumulação de capital e para os próprios trabalhadores provoca intenso debate político.

A partir da crise, o debate procura explicações para as saídas, baseado na historicidade e situação da agricultura além do viés econômico.

(Antônio César Martins Lopes,

graduando Serviço Social, PUC-GO; referência bibliográfica: Milton Santos, Editora USP-edusp-SP/2005;

João Pedro Stedile, Douglas estevam, Editora Expressão Popular/2011/2a edição/SP; Ana Fani Carlos, Editora Contexto/2011/ SP)

   

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Manoel Messias Pereira

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