segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Profesor tem estresse pós-traumático



Professor tem estresse pós-traumático

Doença psíquica diagnosticada nos anos 60 com ex-combatentes do Vietnã agora também aflige quem vive do magistério

Márcia Vieira

A primeira ameaça veio após 23 anos de magistério. "Você é muito abusada. Aqui nesta escola não se manda bater. Se manda matar." Nádia de Souza, de 55 anos, sentiu as pernas tremerem e o coração disparar, mas insistiu. Por cinco meses, apartou brigas entre alunos e ouviu barbaridades, como a do menino de 13 anos que colocou a mão em formato de pistola na sua cabeça e disparou a sentença: "Você aqui não é nada".



Nádia é professora por vocação. Formada em Ciências Sociais, História e pós-graduada em História da África, recebeu prêmios por resultados com alunos do ensino fundamental de uma escola em Realengo, na zona oeste do Rio, e de Botafogo, na zona sul, no pé da favela Dona Marta.



Sempre achou que valia a pena ensinar, apesar das salas superlotadas e do salário baixo (com horas extras e matrícula em duas escolas, ganha em torno de R$ 3 mil). Há um ano, depois das ameaças num colégio no Centro, está em tratamento psiquiátrico. Toma antidepressivos, não sai de casa sozinha e nunca mais pisou em uma escola. Só de passar por perto tem taquicardia e falta de ar. "Eu ando na corda bamba." O nome científico para o mal que a aflige é síndrome do estresse pós-traumático, doença psíquica que começou a ser diagnosticada nos anos 1960 com ex-combatentes da guerra do Vietnã.



Casos como o de Nádia mostram como estão tensas as relações nas salas de aula. É um fenômeno nacional, que não se restringe às escolas de periferia. Em São Paulo, segundo dados do Observatório da Violência do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp), os casos de agressão a professores cresceram 40% por semestre nos últimos três anos.



Em Minas, agressão física e verbal a professor virou tão frequente que o Sindicato dos Professores das Escolas Particulares acaba de lançar uma campanha. O slogan é "Tem algo de errado na escola. Está na hora de corrigir".



O disque-denúncia aberto para ouvir as queixas dos professores mineiros registrou em oito meses um caso de violência contra docentes a cada três dias. "Um conjunto de fatores leva a esse processo. O professor perdeu prestígio. A sociedade está mais violenta. Só que ficamos jogando lixo debaixo do tapete. Não são tomadas medidas para enfrentar o problema", diz Gilson Reis, presidente do sindicato dos professores da rede particular de Minas.



Ainda não se sabe o tamanho do problema. "Precisamos de dados sobre violência nas escolas. Não temos ideia do que acontece no ambiente escolar", diz Miriam Abramovay, coordenadora de Juventude e Políticas Públicas da Faculdade Latino-Americano de Ciência Sociais, que investiga o tema há dez anos.









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Causas da violência







Uma pesquisa realizada pelo Apeoesp em 2006 mostra que os professores apontam a superlotação das salas e a aprovação automática como as maiores causas do aumento de violência dentro de sala. "A escola foi esvaziada nos últimos anos", arrisca Edna Félix, diretora do sindicato dos professores do Rio. "Não tem mais o professor que ajudava na organização da sala, o supervisor pedagógico, o professor-substituto. Não tem inspetores em número suficiente. O professor hoje não tem tempo para preparar aula. E entrar numa sala com 40 alunos sem ter planejamento é uma loucura."



Apesar disso, segundo Edna, os professores não gostam de denunciar. "No ano passado, a direção de uma escola em Vila Isabel foi agredida, os alunos fizeram motim, parecia revolta de presídio. E ninguém quis dar queixa. Há uma pressão grande da coordenação regional e da Secretaria de Educação para não tornar os casos públicos", diz.



Segundo dados da Secretaria Municipal de Educação do Rio, em 2010 apenas dois casos de agressão a professores tiveram sindicâncias abertas.



A coleção de horrores que Edna acompanha é variada. Um aluno de 13 anos quebrou o dedo da professora de português porque ela mandou que ele desligasse seu tocador de MP3. Numa escola da zona norte, duas alunas colocaram veneno no café da sala de professores. Ninguém bebeu porque uma professora desconfiou do cheiro. Em outra escola, uma mãe deu soco numa professora porque não gostou da nota do filho.



"É preciso mais apoio. Uma escola só funciona bem quando há respeito entre alunos e professores. Ensinar é maravilhoso, mas o clima de violência afasta os professores", diz Edna.



Tão triste quanto afastar os professores é impedir que os alunos aprendam. "Todos são vítimas. Professores e alunos. Está todo mundo infeliz", pondera Miriam Abramovay. "Tem de mudar a escola toda. Os professores estão muito pouco preparados para receber alunos do século 21 numa escola que está no século 18."



Há movimentos para tentar melhorar o clima. "Estamos conversando com o Ministério da Educação para fazer cursos de capacitação, para que os professores possam entender o que está acontecendo", diz Miriam.



Em Minas, a secretaria fez um acordo com o Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública da Universidade Federal do Estado.



"Estamos oferecendo curso de mediação de conflito para mais de cem professores e diretores", anuncia Maria Céres Pimenta, secretária adjunta de Educação do Estado de Minas. "Não adianta ter só uma perspectiva repressora. Nós precisamos educar as crianças para respeitarem os professores. Para isso, elas também precisam ser respeitadas."

























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Manoel Messias Pereira

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