terça-feira, 31 de dezembro de 2013

REVELLION 2014 FELIZ ANO NOVO ADEUS ANO VELHO


Que a ternura da nossa existência brilhe como todas as estrelas que aprendemos admirar.
Manoel Messias Pereira

Boa Música - Alta Sensibilidade e Espirituosidade - Rosa Emília Dias







Encerramos o Ano de 2013 - Com a grande intérprete Rosa Emília Dias, aquela chamada cantante brasiliana. E sempre bom ouvir e prestar a atenção nesta afinação no seu cantar.Abraços

Fatos Históricos importantes do dia 31 de dezembro

Em 31 de dezembro de 1931 - Fundação da Escola de Samba Unidos da Tijuca
Em 31 de dezembro de 1936 - Conferência Internacional de Consolidação da Paz de Buenos Ayres, oportunidade em que proclamou à Unidade Americana
Rita Lee

Em 31 de dezembro de 1947 - Nasceu a cantora brasileira  Rita Lee Jones Carvalho

Donna Summer
Em 31 de dezembro de 1948 - Nasceu a cantora norte americana Donna Summer
Fidel Castro e Chê Guevara

Em 31 de dezembro de 1958 - Fugêncio Batista o ditador fugiu de Cuba e Fidel Castro e Chê Guevara tomam a capital cubana, Havana.
Em 31 de dezembro de 1961 - Faleceu o cartunista Péricles de Andrade Maranhão, criador do personagem o Amigo da Onça.
Fernanda Porto

Em 31 de dezembro de 1965 - Nasceu a cantora brasileira  Fernanda Porto
Rosanne Mulholland
Em 31 de dezembro de 1980 - Nasceu a atriz brasileira  Rosanne Mulhollande
Jacqueline Carvalho

Em 31 de dezembro de 1983 - Nasceu a jogadora Jacqueline Carvalho, jogadora de volei, da Selebração brasileira.

Em 31 de dezembro de 2009 - Faleceu em São Jose do Rio Preto-SP, o ativista político, e comunista Antonio Roberto  Vasconcelo (nascido em 1916)

Refletor



refletor

procuro
a luz
no exercício
da escuridão,
e da fulguração
vem
a reflexão,
invento
estrelas
construo o céu
e aguardo
o nascimento
de uma nova
via lacta
em que a paz
existirá,
num mundo
sem templos
oficiais,
pois os Deuses
estarão
apenas
na natureza
e na consciência.



Manoel Messias Pereira

poeta
São Jose do Rio Preto-SP



Feliz 2014 - Uma Conversa Amiga.

Estamos chegando ao final de 2013, sempre conduzindo um blogger, com a intenção primordial de estabelecer a cordialidade, o respeito, o compartilhamento social, a solidariedade, a internacionalidade, a universalidade. Participando do mundo de eventos, de palestras, visitas, feiras culturais. Usando deste expediente preparo-me sempre para estar ao lado da camada trabalhadora deste país.

Nesta minha pouca experiência de 4 anos de blogger, lancei-me na ideia de por neste espaço alguns assuntos como a literatura em relação a crônica, artigos e poesias.Além de abordar a história a política, os fatos históricos do dia a dia. A minha intenção é por estes elementos pra ajudar quem queira na busca conjuntural social, seja no âmbito nacional ou internacional.

Neste ano defini uma cara pra esse blogger. Resolvi lembrar um grande artista da música por dia seja internacional ou nacional. Depois resolvi por uma poesia em cada dia. e sempre ela vem acompanhada com uma música, que faz o casamento perfeito entre aquilo que você lê e ouve. E isto extrai da minha experiencia como radialista que foi de apenas 2 anos .Depois usei a ideia de por os principais fatos históricos em pauta e escolher as principais reportagens e estudos das universidades.

Aproveitando o ensejo, estabeleço a  minha cultura negra na maioria das coisas que faço, até porque é mais fácil pensar como um negro brasileiro, neto de pessoas que acabaram sendo escravizadas no Brasil e que sofreu todas as violências possíveis, como desprezos, batidas policiais, preconceitos, discriminação racial, religiosa, social e racismo. Entender que sou um ser humano que desde aos 5 anos teve uma vida de risco morei em barracos de madeiras de apenas 2 metros por 3 metros e  somente com uma mãe e duas irmãs pequenas. E uma mulher negra com apenas quatro anos de vida escolar, trabalhando como lavadeira em casa de família ou em armazém de café, ganhando um salário irrisório. E tendo essa mãe, praticando culto afro da umbanda e sendo investigada pelo DOPS, a polícia política, como alguém quem praticava atividades subversivas.

Foi daí que minha mãe abriu um terreiro de umbanda.Entrei na Escola e comecei a discutir cultura negra. desde 1963. e por isto o meu interesse pelos temas de cultura afro. Cresci estudei estudos Sociais, na FARFI/atual Unorp, depois fiz História na Faculdade Dom Bosco de Cultura e Arte, iniciei o Curso de Literatura Comparada UNESP, e não terminei ,fiz o Curso de Africanidade UnB, e Latus Senso sobre africanidade na UFSCAR. Fundei a extinta Fusocaab, sobre a cultura Afro, participei da Associação recreativa Rio-pretense, e passei a ser ativista da Comunidade Negra referente aos estudos. Participei do início do Coletivo Anti Racismo Milton Santos da Apeoesp e o Coletivo Anti Racismo da CUT. Dai a minha desenvoltura com o tema.Conheci o grupo Quilombhoje, participei de alguns cadernos. Em 1988 lancei o Livro Revoadas de Sonhos, tive alguns textos publicados na revista "Educatio", na sua maioria falando de temas ligados a questão racial no Brasil. Fui o autor do Manifesto de Rio Preto Contra a Guerra do Iraque.E ativista em favor do respeito a questão Palestina. E ativista no movimento Amndala pela libertação de Nelson Mandela.  Assim como tive alguns  textos publicados em jornais brasileiros.Estudei sobre os Orixás, e escrevi o texto em que já fiz várias palestras sobre "O processo de Discriminação Racial na Educação Religiosa".

Já fiz vários cursos sobre sobre jornalismo.Fiz curso de radialismo. Já participei de vários encontros sindicais. Fui membro Presidente da Associação de Escritores e Poetas de São Jose do Rio Preto-SP. Ja participei da associação de Violeiros, e fui músico de bailes. Fui membro da Pastoral da Comunicação e Pastoral do Trabalho.  E sambista quando precisa.

Politicamente sempre fui ligado ao Partido Comunista Brasileiro - PCB. Confesso que durante o racha de 1992, fiquei perdido por uns tempos no PPS . Mas lugar de Comunista é no PCB, e na questão racial é no Coletivo Minervino de Oliveira. Apoio ainda todos os movimentos sociais classistas proletários em relação a mulher, as orientações sexuais, sou contra a homofobia e pela Paz entre todos os seres humanos.

E hoje o importante fazer deste blogger, um instrumento de compartilhamento entre cada ser humano, temos leitores no Brasil, em diversas partes do mundo como Estados Unidos da América, Portugal, Alemanha, Itália, Espanha, Angola, Moçambique, Malásia, China, França, Reino Unidos entre outros países. Penso que preciso conquistar á América Latina. Sempre faço destaque de reportagens jornalisticas . Assim é que fazemos este blogger. Com toda a humildade do mundo.

Agora estamos no final de 2013. só espero que todos nos possamos continuar, com este instrumento de comunicação pela Paz.

Sou um simples professor da rede pública de ensino, tenho um projeto na escola que é utilizar a poesia na na história na Escola. escrevo poesias desde 8 anos de idade. Sou uma pessoa humana que tem todos os defeitos do mundo. Mas que deseja a todos apenas , um feliz ano Novo em 2014. Que saibamos conduzir com maestria a orquestração desta vida.

A todos seguidores e leitores de Tela da Reflexão, obrigados,


atenciosamente


Manoel Messias Pereira
professor de História
poeta.
  

Festival reuniu adeptos das religiões de matrizes africanas no Forte de Macapá


Oferecimento

Festival mistura ritos de religiões africanas no fim de ano em Macapá
Por  G1 | Para: CBN Foz



 (Foto: Divulgação Faaroyemon)

Festival reuniu  adeptos de religiões de matriz africana no anfiteatro do Forte de Macapá


A cultura afro-brasileira reuniu no anfiteatro da Fortaleza de São José de Macapá, ontem na segunda-feira (30). Adeptos do candomblé, umbanda e mina de nagô poderam acompanhar o tradicional rito das religiões na terceira edição do Festival Águas Amazônicas na Rota de Yemanjá (Faaroyemon), evento que antecedeu o Réveillon na capital. Os ritos  iniciaram-se as 19h e a meia-noite aconteceu a tradicional oferenda às margens do rio Amazonas, no Trapiche Eliezer Levy.

  Músicos derão ritmo ao festival na Fortaleza de São José de Macapá (Foto: Divulgação Faaroyemon)


 (Foto: Divulgação Faaroyemon)

De acordo com os organizadores, o evento já está consolidado por quebrar o preconceito com as religiões de matriz africanas.

"Um dos focos do festival é agregar e confraternizar as religiões com adeptos e simpatizantes", disse um dos coordenadores do festival, pai José de Osossi.

A festividade recebeu  duas mil pessoas durante a confraternização de 2013, número maior que o do ano anterior, quando 1,5 mil pessoas participaram da festa, segundo calculam os organizadores.  Três quintetos de músicos foram os responsáveis por dar ritmo ao festival, que tem como lema a preservação ao meio ambiente.

Banho de cheiro, um dos momentos mais aguardados no festival das águas (Foto: Divulgação Faaroyemon)



Durante o ritual, as pessoas receberam a benção de 11 sacerdotes de religiões africanas. A novidade para este ano é a participação do padre Paulo Roberto, representando o catolicismo para destacar a união entre as crenças.

O tradicional banho de cheiro, um dos momentos mais aguardados do festival, de  2013. Ele feito à base de ervas e perfumes.

"Feito o banho de cheiro para as pessoas que desejam entrar o ano de 2014 com bastante energia positiva e muita sorte", garantiu pai Rogério de Odé, membro da comissão de organização do Festival Águas Amazônicas da Rota de Yemonjá.

Oferendas a Yemanjá serão depositadas no Rio Amazonas, no Trapiche Eliezer Levy (Foto: Divulgação Faaroyemon)



Oferendas
O festival é conhecido por mesclar a fé da cultura africana com a preservação ao meio ambiente. Como as oferendas à Yemanjá foram depositadas em uma barca no rio Amazonas, os organizadores do evento orientam sempre  o uso de materiais biodegradáveis.

As comidas, por exemplo, foram embaladas em pratos de isopor ou em folhas naturais.  Os presentes que foram  transportados em cestas de vime, ou em cestas  confeccionadas com palha.E assim foi feito.

Recipientes de plástico e metal foram substituídos pelos de madeira. Ao invés de bonecas de plástico, houveram as  utilizações de bonecas  de pano.

Os frascos de perfume e de champanhe terão seus conteúdos derramados nas águas do rio Amazonas, e os vidros guardados para serem depositados em sacos de lixo espalhados pela orla.



Publicado em Amapá
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Fiel é a Palavra

Uma Breve Perspectiva Histórica sobre a Presença dos Evangélicos Reformados no Brasil

por Raylinn Barros da Silva



Capa do livro: Justino Celestino de Oliveira Neto
Sobre o autor [1]

A obra organizada pelos historiadores Elizete da Silva, Lyndon de Araújo Santos e Vasni de Almeida, traz à luz uma importante discussão histórica acerca da presença das igrejas protestantes reformadas no Brasil, mais nomeadamente anglicanos, luteranos, presbiterianos, batistas, metodistas e congregacionais.

Na primeira parte da obra, os autores dão enfoque à institucionalização das igrejas no país. Anglicanos, Luteranos, Congregacionais, Presbiterianos, Metodistas e Batistas construíram seus alicerces históricos de formação de suas comunidades a partir de uma nova visão de mundo, de homem, de sociedade e de país. A institucionalização das igrejas é a preocupação dos autores, entender e discutir do ponto de vista histórico os evangélicos reformados em suas trajetórias históricas traz um panorama novo para nossa historiografia e abre novas possibilidades de pesquisas futuras dentro da temática ora exposta.

Na segunda parte, a obra propõe uma discussão sobre novos temas no campo religioso nacional na seara evangélica que é a questão da mídia e as problemáticas em relação à questão de gênero dentro do universo das igrejas pesquisadas pelos seus autores. A necessidade de compreensão da relação das igrejas com o fenômeno da mídia nacional em todas as suas dimensões favorece a abertura de novas preocupações de pesquisa para a compreensão do fenômeno religioso nacional que somada ao debate sobre as questões de gênero nos ajuda a entender os novos horizontes que as pesquisas acerca das religiões favorecem.

A primeira contribuição das discussões colocadas pelos autores é a importância das leituras sobre parcela importante da população brasileira os evangélicos reformados no campo historiográfico nacional. A renovação historiográfica que alcançou a academia a partir do século passado tem nessa referida obra seu fecundo sinal ao enfocar novos objetos: a religião e a religiosidade dos "crentes"; novos enfoques: a institucionalização das igrejas; e novas preocupações: as questões de gênero, a mídia, a educação.

Os estudos sobre as nossas religiões, nossas religiosidades e, sobretudo um mergulho histórico para entender a institucionalização das denominações cristãs reformadas no Brasil vem contribuir de forma significativa para a formação de nossa história cultural e religiosa. Ao propor através da abordagem da obra um enfoque na formação dessas instituições os autores lançam um novo olhar sobre a presença protestante no Brasil.

Os autores localizaram o século XIX como o recorte histórico de uma presença mais sistemática das diversas denominações cristãs no país. Importante é, para o leitor, compreender que esse século em matéria de história foi crucial para a configuração de um novo modelo de país e de sociedade que estava nascendo a partir dos primeiros momentos de um Brasil que recebia a corte portuguesa e anos mais tarde proclamava a sua independência.

É importante constatar que esse momento da história do Brasil localizado pelos autores em suas investigações históricas que coincide com a institucionalização das denominações evangélicas no país evidencia a configuração de uma nova realidade econômica: a questão comercial com a formação de uma burguesia que aspirava novas oportunidades de negócio, novos interesses, novas formas de perceber o mundo a sua volta.

A realidade brasileira do século XIX em diante tempo histórico abordado pelos autores traz também uma nova configuração política nacional. A formação do Estado Nação mesmo tendo ainda na cultura católica luso-brasileira seu grande referencial religioso demonstrou que a hegemonia da igreja de Roma enquanto religião já não era tão hegemônica, assim, os evangélicos reformados já estavam se "espalhando" por todo o país, uma realidade nova que somada à urbanização por qual passava a sociedade brasileira a época favoreceu a expansão religiosa dessas igrejas no país.

Entre as contribuições da referida obra consideramos o fato da mesma enfatizar o chamado pluralismo evangélico nacional. Abordar não um protestantismo, mas protestantismos. A pluralidade religiosa nacional no aspecto evangélico seja ele reformado enfoque da obra como neopentecostal, abre inúmeros campos de análise e de pesquisa de caráter histórico visto a diversidade de igrejas, de visões de mundo, de culturas e de modos de vida das populações crentes.

A abordagem proposta pela obra a partir de uma análise dos evangélicos reformados, mas sem deixar de lado a preocupação de localizá-los dentro de um universo bem mais amplo de cristãos coloca por esse não simples motivo a discussão num patamar de importância para a historiografia que aborda as relações igreja-sociedade na história do país, historiografia não menos importante e a meu ver não ultrapassado academicamente falando em termos de importância teórica e metodológica de abordagem da história de nossa sociedade.

Por desligar-se dos paradigmas de abordagem dos protestantes no Brasil que em outros trabalhos sempre deram enfoque nas conhecidas "ondas", nas já sedimentadas "classificações", e as já saturadas "terminologias" para enquadrar esses ou outros temas relacionados às igrejas protestantes é outro sinal significativo de uma nova concepção historiográfica, de uma nova história da presença dos evangélicos no Brasil, referenciais que estão presentes na escrita da obra aqui resenhada.

Reafirmamos a importância de destacar a preocupação dos autores com a questão referente à diversidade religiosa brasileira, mesmo em se tratando do campo protestante e esse último de forma especial por se tratar do tema em debate na obra. A dimensão dos religiosos não católicos no Brasil não permite que desprezemos esse tipo de preocupação, pois se assim não fosse, a discussão cairia facilmente nas armadilhas que as generalizações conceituais costumam fazer, ao enquadrar, por exemplo, a igreja protestante como se fosse uma igreja homogênea, coisa que está mais claro que nunca que não o é.

Consideramos ainda observar o esforço da obra em não desconectar as questões relativas à presença protestante no Brasil com a sua raiz histórica, ou seja, a reforma luterana do início do século XVI. Entender as origens e os antecedentes históricos das novas religiões é importante do ponto de vista histórico pela necessidade da localização espacial e temporal dos acontecimentos que são na verdade a base de toda revolução religiosa que alcançou todo o ocidente católico a partir das ideias de Lutero, essas ideias chegaram no Brasil e estão na base da formação de uma nova realidade religiosa nacional.

Nomeamos como justificativa para a leitura da obra a necessidade que nossa sociedade tem de compreender a grande presença protestante e evangélica em toda a estrutura da vida brasileira. Se o início do século XIX é marcado pela presença mais sistemática e o início da organização das igrejas cristãs não católicas no Brasil o que é mostrado pelos autores, no século XX e XXI há uma verdadeira presença dos evangélicos em toda a estrutura social do país através de atuações na área da educação, da saúde, de obras assistenciais, para além é claro, da igreja enquanto templo religioso que aglutina e reúnem fiéis.

Consideramos importante observar algumas lacunas que a obra deixa, mas que não invalida seu mérito e importância. Não há um questionamento da presença das igrejas evangélicas reformadas e de seus membros com enfoque no campo político nacional. Essa preocupação em relacionar os evangélicos com a política brasileira se mostra de fundamental importância para a compreensão do universo dos evangélicos no país e de quebra nos apresentaria novos horizontes de compreensão do fenômeno de crescimento dessas igrejas na estrutura social brasileira. Acreditamos que depois de um longo período quase sem se fazer notar, a relação dos evangélicos com a política, como também a atual participação dos mesmos no debate político nacional vem gradativamente influenciando os caminhos da nossa democracia.

Se no século XIX ocorreu a institucionalização dos evangélicos no Brasil como é apresentado pela obra, o final do século XX em diante vem nos mostrando o que consideramos a institucionalização política dos evangélicos. A presença da chamada bancada evangélica no congresso nacional é testemunha dessa nova institucionalização que diferentemente do século XIX não ocorre mais na forma de templos e conquista de fiéis para seus cultos, mas agora na forma de influência direta na configuração política nacional, no que, a meu ver, mostraria o interesse das igrejas evangélicas no estabelecimento de uma agenda moral para o país por intermédio do debate político.

Outro silêncio da obra consiste na ausência da problematização da relação entre a presença dos evangélicos no país e os valores contemporâneos de nossa sociedade. Em que medida a cultura evangélica estaria atuando na configuração e formação de novos valores morais, sociais e educacionais, claro, para além dos valores religiosos dos próprios crentes. Como estaria a cultura nacional brasileira identificada pela personalidade do país do futebol, do carnaval e das festas populares diante do avanço de uma identidade religiosa evangélica tão presente em nosso cotidiano e que segundo o último censo do IBGE já totaliza 22% da população brasileira ou 42 milhões de pessoas?

Fica ainda uma reflexão: porque os evangélicos reformados em análise na obra pelos mesmos dados do IBGE citados anteriormente somam apenas 6 milhões de seguidores, ou seja, 14% do universo atual de evangélicos nacionais? Sendo anglicanos, luteranos, presbiterianos, batistas, metodistas e congregacionais os primeiros a se institucionalizarem no país a partir do século XIX, porque hoje em números gerais são parcela minoritária comparada aos números totais do universo evangélico no país?

Mas para além dessas lacunas e silêncios da obra, ou seja, a preocupação com o fenômeno da presença dos evangélicos no debate político nacional, na configuração da democracia, da relação da cultura evangélica com a cultura nacional, os valores contemporâneos nacionais e por último a localização das igrejas objeto de análise do livro em relação ao quantitativo dos outros evangélicos no Brasil, considero, de forma geral, a obra como leitura de importância ímpar para o debate historiográfico em torno do universo religioso nacional.

Nas vésperas das comemorações dos 500 anos da reforma protestante no mundo ocidental e que quebrou com o monopólio do catolicismo em matéria religiosa Fiel é a Palavra: Leituras Históricas dos Evangélicos Protestantes no Brasil contribui de forma harmoniosa, conceitual, metodológica e histórica para a compreensão de um Brasil que não é mais tão católico como foi nos seus três primeiros séculos após o início da colonização portuguesa. Atualmente, não há mais como conceber qualquer pesquisa séria que se proponha em entender a sociedade brasileira sem se pensar na presença evangélica no país.

Finalmente, consideramos importante observar que a obra aqui resenhada abre a possibilidade de renovação da história da presença protestante no Brasil como citamos no início do texto por se distanciar dos referenciais de compreensão desses mesmos protestantes no país através das conhecidas ondas, classificações e terminologias. Por esse motivo inicial e que foi também preocupação dos autores, a obra pode contribuir para a formação de uma nova história da presença dos evangélicos protestantes no Brasil e por consequência, contribuir para a visão crítica do leitor que sobre essa obra venha a se debruçar.

Resenha

SILVA, Elizete da; SANTOS, Lyndon de Araújo; ALMEIDA, Vasni de; (org.). Fiel é a Palavra: Leituras Históricas dos Evangélicos Protestantes no Brasil. Feira de Santana: UEFS Editora, 2011, 480 p. ISBN 978-85-99799-27-7.

[1] Graduado em História e Pós-Graduado em Ensino de História pela UFT (Universidade Federal do Tocantins). É membro da Associação Brasileira de História das Religiões (ABHR).





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segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

Boa Música - Alta Sensibilidade e Espirituosidade - Tantinho da Mangueira








Tantinho da Mangueira um sambista por excelência, seu nome de batismo Devani Ferreira, nascido em 147 no Rio de Janeiro, um homem simples humilde, mais um sambista um talento que merece toda a reverencia e respeito.Podemos definir como um bamba. 

poesia do dia - Cansaço - de Edelcio Smargiassi

Na avenida da minha casa
pousam almas cansadas.
Nos bares da avenida da minha casa
pousam almas cansadas cansadas.
Nas mesas dos bares da avenida da minha casa
pousam almas cansadas cansadas.
Nos copos das mesas dos bares da avenida da minha casa
pousam almas cansadas cansadas cansadas cansadas.
Nas bocas dos copos das mesas dos bares da avenida da minha casa
pousam almas cansada cansada cansadas cansadas cansadas.
Nas almas das bocas dos copos das mesas dos bares da avenida da minha casa
pousam almas cansadas cansadas cansadas cansadas cansadas cansadas.


Edelcio Smargiassi

poeta, professor brasileiro

radicado em Guaxupé - MG
Brasil



Paulinho da Viola interpreta Toquinho e Vinícius de Morais



Fatos Históricos importantes do dia 30 de dezembro

Câmara Cascudo

Em 30 de dezembro de 1898 - Nasceu Luis da Câmara Cascudo, folclorista e escritor brasileiro.

URSS
Em 30 de dezembro de 1922 - Criação da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas URSS que compreendia Rússia, Bielorrussia, Ucrânia e Transcaucasia.



Omar Bongo

Em 30 de dezembro de 1935 - Nasceu El Hadj Omar Bongo Odimba, na antiga Lewai, empregado do Correios Congolês, maçon e chegou a presidência do Gabão. Faleceu em 08 de junho de 2009 em Barcelona.
Harry Berger ou Arthur Erwert
Luis Carlos Prestes
Em 30 de dezembro de 1936 - Sumário de culpa de Luis Carlos Prestes e Harry Berger, em relação as atividades políticas no Brasil, quando da Aliança Nacional Libertadora - ANL
Rei Miguel
Em 30 de dezembro de 1945 - O rei Miguel (Mihai) da Romênia abdicou-se do poder sob pressão popular , quando foi declarada a República Popular da Romênia e em 1965 é que passou a ser chamada de Republica Socialista da Romênia em 1965 quando Nicolau Ceuscescu  se tornou líder do Partido e dois anos mais tarde chefe de Estado.
Patti Smith

Em  30 de dezembro de 1946 - Nasceu  Patti Smith, poetisa, cantora e musicista norte americana
Em 30 de dezembro de 1968 - No Brasil os golpistas de 1964, anunciavam a lista dos políticos cassados entre eles só um da Arena , todos os outros do MDB. Eram eles, da Arena Jose Carlos Estelita Guerra, do MDB eram David Jose Lerer-SP, Gastone Righi de SP,Helio Henrique Pereira Navarro -SP, Helio Henki -GB, Hermano de Deus Alves-SP, Jose Lurtz Sabia -SP, Marcio Moreira Alves GB, Matheus Jose Smitd Filho do RS, e Ricardo Bayana Acher Silva do MA.
Em 30 de dezembro de 1972 - Faleceu Carlos Nicolau Danielli, torturado pela repressão governamental brasileira. E No dia 5 de janeiro de 1973 cnsta que o torturador Capitão Ubirajara, mostrou para os outros presos vários recortes de jornais e chegou a dizer "isto vai ocorrer também com vocês".
O livro de Osvaldo Bertolino conta a vida deste revolucionário brasileiro.
Shelton Melo

Em 30 de dezembro de 1972 - Nasceu Selton Melo, ator, dublador, diretor e produtor de teatro, televisão e cinema. Um dos grandes talento da nossa dramaturgia .
Letícia Colin

Em 30 de dezembro de 1989 - Nasceu Letícia Helena Queiroz Colin, atriz, cantora e apresentadora de Televisão, brasileira.
Em 30 de dezembro de 1993 - Conforme a Lei Estadual 8550, cria-se o município de Ipigua - SP, que antes era um distrito da cidade de São José do Rio Preto - SP.
Em 30 de dezembro de 1996 - O governo do Estado de São Paulo, anunciou a investigação das denuncias de vazamento de materil radioativo e contaminação de funcionários no Centro Experimental Aramar no município de Iperó - SP.
Sadan Hussei

Em 30 de dezembro de 2006 - Os Estados Unidos da América, assassina o presidente do Iraque, Sadam Hussein e brinda o mundo na véspera de Ano Novo com este desconforto de um enforcamento em pleno Século XXI, mostrando como este país descumpre com galhardia a Declaração Universal dos Direitos Humanos.

PNE: texto do Senado reduz recursos para a educação pública



PNE: texto do Senado reduz recursos para a educação pública

Mariana Tokarnia - Agência Brasil


Brasília - O Plano Nacional de Educação (PNE), aprovado pelo Senado Federal, foi criticado por entidades da área de educação, que tentarão retomar na Câmara dos Deputados o texto aprovado anteriormente pela Casa. Entre as críticas estão a redução do orçamento da educação pública, a imposição de metas de alfabetização, que podem prejudicar a aprendizagem, e a falta de exigência de clareza na colaboração da União, estados e municípios no financiamento para a educação. Eles reclamam ainda agilidade na tramitação.

“Esse PNE, do jeito que está, vai ter mais chance de ser cumprido porque é ruim. Não adianta fazer um PNE café com leite. Só vai expandir matrícula e não dar padrão de qualidade”, alertou o coordenador-geral da Campanha Nacional pelo Direitos à Educação, Daniel Cara. A Campanha é uma rede composta por mais de 200 organizações em todo o Brasil.



*Mercadante Lamenta que o PNE tenha ficado para 2014



O PNE estabelece metas para serem cumpridas em dez anos, entre elas a erradicação do analfabetismo, a oferta de educação em tempo integral e o aumento das vagas no ensino técnico e na educação superior. O PNE também estabele que 10% do Produto Interno Bruto (PIB) seja investido no setor.

O projeto tramita há três anos no Congresso Nacional. Já foi aprovado pela Câmara e, em dezembro, pelo Senado. Como teve modificações, terá que voltar à Câmara dos Deputados. No Senado venceu a versão governista, que, pela análise da Campanha, reduz as responsabilidades da União pela expansão de matrículas e qualidade da educação.

Daniel Cara, que tratou do assunto com alguns líderes partidários na Câmara dos Deputados, disse que a tendência é que seja retomado o texto aprovado pela Casa. Mesmo assim, como a maioria dos deputados é governista, ele não está otimista. “Acho que temos 15% de chance de ter um PNE pra valer”.

No texto atual, o investimento público deve ir para a educação e não para a educação pública, como estava no texto aprovado na Câmara. O argumento do governo é que o dinheiro possa beneficiar programas como o Programa Universidade para Todos (Prouni) e o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), voltado para matrículas em instituições particulares. Com isso, no entanto, reduz-se o investimento em educação pública, argumentam as entidades contrárias ao texto aprovado no Senado.

Também foram excluídos do texto, as duas novas fontes de financiamento aprovadas pela Comissão de Educação, Cultura e Esporte do Senado: 50% do bônus de assinatura dos contratos de partilha de produção de petróleo e gás e pelo menos 25% dos recursos das compensações financeiras da União, estados, Distrito Federal e municípios, para exploração mineral e de recursos hídricos usados para geração de energia elétrica.

O texto que foi aprovado no Senado também abandonou as metas, aprovadas na Comissão de Educação, de que 40% das vagas nas instituições públicas de ensino superior e 50% das vagas no ensino profissionalizante fossem para alunos de escolas públicas. Estabelece ainda que a partir do sexto ano da entrada em vigor do PNE a alfabetização comece aos 7 anos, reduzindo-se essa idade para os 6 anos a partir do décimo ano de vigência do plano.

“Há o risco de reduzir o parâmetro de qualidade, considerar qualquer tipo de leitura como plenamente alfabetizado”, disse a diretora-executiva do Todos pela Educação, Priscila Cruz. Ela ressalta que uma má alfabetização em português e matemática tem impacto futuro. “[O PNE] tem várias questões de retrocesso. Todo ano temos resultado ruim em matemática, nas avaliações nacionais e internacionais. O ensino médio está estagnado há dez anos”, disse.

Priscila acrescenta que “o ano termina muito ruim. O Senado deu uma demonstração de fraqueza, mostrando que a educação não é prioridade para o país”.

A presidenta da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), Cleuza Repulho, ressaltou a demora na tramitação e a urgência na aprovação. “O PNE tem que ser votado assim que o Congresso voltar à atividade”. Ela lembrou que de 17 a 21 de fevereiro será realizada a Conferência Nacional de Educação (Conae), que reunirá, em Brasília, o poder público e a sociedade civil, para discutir a implementação do PNE. “Sem o PNE, vamos ter uma conferência sem sentido, vamos apenas protestar contra três anos de não aprovação do plano”.

As metas do PNE*:

1. Educação infantil (expansão da creche e universalização da pré-escola)
2. Ensino fundamental (universalização do acesso e conclusão na idade certa)
3. Ensino médio (universalização do acesso e matrícula na idade certa)
4. Educação especial (universalização do acesso e atendimento educacional especializado para alunos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação)
5. Alfabetização na idade certa (8 anos, 7 anos e, ao final do plano, 6 anos)
6. Educação em tempo integral (50% das escolas e 25% dos alunos da educação básica)
7. Qualidade da educação básica (melhoria do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica – IDEB)
8. Elevação da escolaridade de jovens de 18 a 29 anos e diminuição da desigualdade educacional (rural, Norte/Nordeste, 25% mais pobres)
9. Erradicação do analfabetismo e redução do analfabetismo funcional (50%)
10. Educação de jovens e adultos integrada à educação profissional (25% das matrículas do ensino fundamental e médio)
11. Educação profissional de nível médio (triplicar matrículas e assegurar 50% de vagas gratuitas)
12. Educação superior (expansão do acesso, especialmente população 18-24 anos)
13. Qualidade da educação superior e titulação do corpo docente (75% mestres e doutores, sendo 35% doutores)
14. Expansão da pós-graduação (60 mil mestres e 25 mil doutores por ano)
15. Formação de profissionais da educação (inicial e continuada)
16. Formação de professores da educação básica (formação continuada e pós graduação)
17. Valorização dos profissionais do magistério público (remuneração equiparada a demais profissionais)
18. Carreira dos profissionais da educação básica e superior (planos e piso salarial)
19. Gestão democrática do ensino público (básico e superior)
20. Investimento público em educação (10% do PIB)
21. Estimular Produção Científica (4 doutores por cada mil habitantes)

*Fonte: Agência Senado

Edição: Fernando Fraga




Direitos autorais: Creative Commons - CC BY 3.0

"Completamente Rosado" Luís da Câmara Cascudo e a Escrita Biográfica de Jerônimo Ribeiro Rosado




"Completamente Rosado": Luís da Câmara Cascudo e a Escrita Biográfica de Jerônimo Ribeiro Rosado (Parte 1)

por Bruno Balbino Aires da Costa

Bruno Balbino Aires da Costa[1]



Jerônimo Ribeiro Rosado nasceu no dia oito de dezembro de 1861 na Vila de Pombal, na província da Paraíba. Em 1885, fica órfão e muda-se para Catolé do Rocha, passando a trabalhar como comerciante na loja do senhor Amorim, onde dormia, comendo na pensão de Maria Joaquina da Conceição.[2] No mesmo ano, por incentivo do Juiz municipal de Pombal, Venâncio Neiva, que visitava constantemente Catolé do Rocha desde 1879, Jerônimo Rosado, segundo Cascudo, ficou instigado a estudar medicina no Rio de Janeiro, abandonando o balcão do comércio em 1885 para estudar na Corte. Quatro anos depois, agora formado em Farmácia pela Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, Jerônimo Rosado retorna a Catolé do Rocha, instalando na cidade a "Botica de Sêu Rosado". No final do ano de 1889, cumpria o que tinha combinado com a senhorita Maria Amélia Henrique Maia: casar-se com ela. Entretanto, a vida de recém-casado em Catolé do Rocha estava com os dias contados. Em 1889, Jerônimo Ribeiro Rosado recebe uma carta do médico Francisco Pinheiro de Almeida Castro, convidando-o para instalar, sob o seu patrocínio, uma farmácia em Mossoró. Segundo Cascudo, Jerônimo Rosado aceita o convite de Almeida Castro, requerendo à Câmara municipal da cidade licença para instalar uma farmácia na rua Graf, começando a partir daí sua "servidão jubilosa de quarenta anos."[3]

Todas estas informações biográficas, apresentadas até agora, foram retiradas do livro Jerônimo Rosado: uma ação brasileira na província (1861-1930,) escrito por Luís da Câmara Cascudo em 1966, e publicado pela editora carioca Pongetti em 1967.

Este livro trata da história de vida de Jerônimo Rosado, patriarca da família, e de sua "ação" e serviço a Mossoró. Luís da Câmara Cascudo é convidado por Vingt-un Rosado, mecenas da cidade, para escrever uma história, não especificamente de Mossoró, mas da trajetória de vida de Jerônimo Rosado, pai de Vingt-un, e a sua relação com a própria cidade.

Na carta do dia doze de agosto de 1966, Luís da Câmara Cascudo responde a Vingt-un Rosado,[4] aceitando o convite para escrever a biografia de Jerônimo Rosado: "Sargento-mor, Sobre Jerônimo Rosado? Nem carece perguntar...Topo. Capitão-mor."[5] Luís da Câmara Cascudo, cumpre sua missão: escrever sobre a cidade, desta vez, sobre um dos seus "plantadores": Jerônimo Rosado.[6]

A biografia de Jerônimo fez parte do projeto de Vingt-un de estabelecer uma aproximação entre a história de sua família e a história de Mossoró. Esta tendência esteve presente no plano editorial da Coleção Mossoroense[7], desde seu início, no final dos anos quarenta até os dias atuais,que lançou vários números versando não só sobre a vida de Jerônimo Rosado, mas também de Dix-sept, Dix-huit, Nono Rosado, Vingt e Tércio, todos fazendo parte da memória e da história da cidade e através da mesma se imortalizam.[8]

Para escrever a biografia, Cascudo teve o auxílio do próprio Vingt-un Rosado.[9] É este que fornece ao intelectual toda a documentação, livros, cartas íntimas, arquivo comercial, relatórios administrativos, reminiscências das filhas e dos filhos, netos, noras, genro, "páginas úmidas de emoção",[10] o qual é descrito assim:

Sargento-mor querido,

Estou completamente rosado(grifo nosso). Trabalhando. É um mundo em que deverei ajustar-me, devagar e cuidadosamente. V. vai mastigar brasas com as minhas perguntas. Mande, mande, mande... O nome de ALMEIDA que trabalha com Rosado na farmácia AZEVEDO. É farmacêutico e quero o nome todo. Quando a FÁRMACIA AZEVEDO tornou-se FARMÁCIA ROSADO? Ficava na rua do Graf? Até quando? Nome atual da RUA GRAF (...).[11]

Ao receber de Vingt-un a documentação sobre a vida de Jerônimo Rosado, Cascudo sai de sua escrivaninha e se desloca para o mundo do seu biografado, construindo sua vida como texto ao mesmo tempo em que ele se constrói como biógrafo, deslocando-se para um mundo que o mesmo Cascudo criou, o qual está inscrito momentaneamente, ficando "completamente rosado", justamente para poder falar sobre Jerônimo.

É interessante notar que mesmo Vingt-un possuindo em suas mãos todas as fontes e recursos para escrever a história de vida do seu pai, esse papel é transferido para Cascudo, embora tenha sido acrescido ao livro Jerônimo Rosado: uma ação brasileira na província (1861-1930) dois trabalhos, que correspondem a dois terços da obra, de autoria de Vingt-un versando sobre Jerônimo Rosado. O interesse de Vingt-un em anexar seus trabalhos aos textos de Cascudo é estratégico, pois projeta a sua própria escrita. Desse modo, temos uma dupla autoria: Cascudo e Vingt-un. Porém oficialmente a autoria é destinada ao primeiro em detrimento do segundo. O que se coloca é: Se Vingt-un escreveu sobre seu pai, por que a necessidade de convidar Cascudo? Em seus escritos e em entrevistas Vingt-un sempre se preocupou em se escusar desse papel de escritor, segundo ele, por não considerar destinado para essa função, cabendo-lhe, de fato, apenas organizar livros.[12]Mesmo possuindo todo o arsenal documental para elaborar uma biografia de seu Pai, Vingt-un convida Cascudo. O motivo do convite não foi por causa da inabilidade de Vingt-un para a vida escriturária. O que explica Luís da Câmara Cascudo escrever sobre a biografia de Jerônimo Rosado é justamente por sua posição diferenciada de autoria, uma escrita que é recebida pela sociedade com certo status daí a importância de uma biografia produzida por ele. Além disso, vale salientar que um dos gêneros literários em que Cascudo mais se deteve durante a sua vida intelectual foi a biografia.

Na década de trinta, Cascudo escreve: O Conde D Eu (1933), Em memória de Stradelli (1933), O Marquês de Olinda e o seu tempo (1938) e O doutor Barata (1938). Na década de cinquenta foram duas biografias: História de um homem (1954) e Vida de Pedro Velho (1956) e nos anos sessenta três: Vida breve de Auta de Sousa (1961), Nosso amigo Castriciano (1965) e Jerônimo Rosado: uma ação brasileira na província (1967). Todas estas biografias cascudianas versam sobre os personagens vinculados a história política e intelectual do Rio Grande do Norte e do Brasil. Em grande medida, estas biografias são edicadas aos personagens ligadas à monarquia, justamente porque Cascudo simpatizava com esta forma de governo.[13]

Um traço marcante que atravessa a escrita das biografias supracitadas é o predomínio da visão romântica em relação aos biografados. Sobre esse estilo de produção biográfica, Pierre Bordieu caracteriza-o por uma escrita que toma o sujeito na sua unidade, na filosofia de sua existência, num relato linear e totalizante.[14]

No caso da grafia de vida de Jerônimo Rosado, a qual nos deteremos aqui, esse estilo romântico aparece em vários momentos da escrita cascudiana, como, por exemplo, quando o próprio Cascudo toma a trajetória de vida de Jerônimo na sua unidade e totalidade: "Um Homem é invariavelmente a soma dos muitos homens que nele vivem. O meu Jerônimo Rosado é o que encontrei no diagrama do percurso, de 1861 em Pombal a 1930 em Mossoró. O meu, vale dizer, visto por mim." [15] O Jerônimo Rosado de Cascudo é uma criatura reservada, recatada, desconfiada, homem que planta e cava gipsita ao mesmo tempo em que cria e educa os filhos. Como mostra o trecho acima, Luís da Câmara Cascudo tem convicção da construção de um Jerônimo Rosado dele. Jerônimo é visto por ele de forma fragmentada, no entanto os fragmentos de vida do seu biografado, quando somados pela sua narrativa, constituem uma pessoa inteira. Assim, a vida de Jerônimo é apreendida por Cascudo na sua unidade como se seu biografado fosse uma soma de particularidades que o singularizam ao mesmo tempo em que o totaliza dando-lhe uma impressão de conjunto. Posto desta maneira, quais imagens de Jerônimo Rosado foram escolhidos por Cascudo para comporem uma unidade de vida ao seu biografado?

As imagens de Jerônimo selecionadas por Luís da Câmara Cascudo estiveram em consonância com as imagens da cidade de Mossoró. A estratégia de Cascudo de tomar Jerônimo a partir de uma multiplicidade de imagens esteve necessariamente ligada à produção de uma identidade que urdisse o homem a cidade. Ao biografar Jerônimo Rosado, Cascudo queria tratar de Mossoró, exatamente para vincular a cidade a família Rosado.

O livro Jerônimo Rosado: uma ação brasileira na província (1861-1930) (1967), foi organizado obedecendo às regras do estilo romântico, no qual o biografado é escrito e descrito a partir de um sequência linear de acontecimentos, propostos pela regularidade temporal ao mesmo tempo que sua vida é pensada de forma coerente, unívoca, construída por uma unidade discursiva que não cessa de apresentar um Jerônimo Rosado na sua integralidade conferindo-lhe uma vida uniforme, sem descompassos nem descontinuidades. Nesse sentido, Cascudo divide o livro em cinco capítulos.

No primeiro, o autor registra apenas as cenas iniciais do livro, como: o convite feito por Vingt-un para escrever sobre a biografia de seu pai, passando por uma síntese geral da vida do próprio Jerônimo Rosado, e, por fim, Cascudo aponta como o livro foi organizado e a razão da sua escrita: "Não escrevi o elogio de Jerônimo Rosado, mas expus a documentária de sua vida, modesta e benemérita. Uma ação brasileira na província." [16]

Chamamos a atenção para o fato de Cascudo construir a biografia de Jerônimo Rosado a partir de um sentido de vida que tem como objetivo primordial a missão na província. Esta categoria espacial evidenciada por Cascudo é pensada por ele sob o signo do regionalismo em que a nação se constrói. O nacional é entendido a partir da província, daí a ação de Jerônimo Rosado de "civilizar o sertão", como analisaremos posteriormente, se coloque como sua contribuição para civilizar a nação, pois para Cascudo o sertão, a província, é o reduto do Brasil original.

A biografia de Jerônimo segue dois traçados principais que percorrem todo itinerário do livro: a vida simples e o benemeritismo de "Seu Rosado". Ao invés de escrever primeiramente sobre a trajetória cronológica da vida de Jerônimo Rosado, Cascudo expõe mais especificamente no segundo capítulo, suas virtudes, suas singularidades em meio ao universo que Jerônimo circulou e participou. Cascudo apresenta Jerônimo Rosado como uma singularidade em meio à pacata cidade de Mossoró, um contraponto a essa sociedade, uma particularidade e não uma metonímia. Vejamos:

Numa cidade de cadeiras na calçada, "rodinhas" de conversa, anedotário solto, vocabulário ardente, timbres altos da emissão sonora das vozes nordestinas, das gargalhadas dinamizadoras hormonais, "casos" do coronel Vicente Mota, "respostas" de Costinha de Horácio, comunicação afetuosa esquentada em confidências de urtiga e pimenta, seu Rosado era uma exceção notória, uma solução de continuidade (grifo nosso), uma pausa silenciosa na orquestração fremente dos desabafos amistosos. Um homem que não ria, não gritava, não dizia nome-feio. Falava depressa, ciciado, baixinho, como se segregasse o recado discreto. Não bebia álcool. Não acendia o grosso cigarrão comunitário, índice sertanejo das prosas animadas. Saudava a todos, operários, mendigos, vadios, crianças.[17]

Jerônimo Rosado é descrito como uma "exceção notória", mas também como "solução de continuidade". Ao mencionar o continuísmo, Cascudo recorre à própria noção de tradição. Para ele, Jerônimo Rosado seria a expressão da tradição, pois é descrito como alguém que se mantinha fiel aos seus princípios e que estava diretamente ligado ao seu ambiente, ao seu espaço, legitimando a continuidade dos Rosados em Mossoró.

Luís da Câmara Cascudo urde a vida de Jerônimo comparando-a a própria sociedade em que o seu biografado estava inserido. Esse modo de escrever, comparando, elabora um modelo que se distancia organicamente do meio social que está compartilhando, produzindo-lhe uma identidade a partir da diferença que se constrói em relação à outra realidade que, no caso, é coletiva: a sociedade mossoroense.

Desta maneira, a escrita cascudiana apresenta o "coletivo" não para evidenciá-lo, pelo contrário, para fazer emergir dentro dele aquilo que lhe é mais significativo: o indivíduo, tornando-lhe o centro gravitacional da narrativa, comparando-o para diferenciá-lo e não para torná-lo o mesmo, possibilitando uma leitura, instituindo uma identidade pela distinção, ou seja, distingui-lo para torná-lo possível de ler em um universo que é descrito uniformemente.

Enquanto, Jerônimo Rosado é descrito como calado, discreto e não ri, a narração destes detalhes anedóticos constituí o próprio fascínio e o sentido do gênero biográfico romântico,[18] os mossoroenses são caracterizados pelo "vocabulário ardente, timbres altos da emissão sonora das vozes nordestinas, das gargalhadas dinamizadoras hormonais." Se Jerônimo Rosado fosse apresentando, por Cascudo, como qualquer outro mossoroense sua singularidade não apareceria, logo, a dimensão do biografado não poderia ser possível.

Cascudo, evidencia um Jerônimo inscrito numa sociedade que lhe é estranha, embora o seu biografado e os habitantes de Mossoró estejam coletivamente partilhando das mesmas experiências e do mesmo meio social. Um jogo de contrastes sonoros: em meio às gargalhadas altas e do amontoado de vozes dos munícipes, o Jerônimo cascudiano, mesmo ciciando, é uma "exceção notória". Assim, Cascudo institui um paisagem desenhada pelos contrastes que coadjuva o coletivo e protagoniza o indivíduo, fazendo ver um "retrato natural" do seu biografado a partir da perspectiva da "paisagem social" onde ele mesmo viveu durante quarenta anos.[19] Uma ficção do saber romântico, que torna o biografado diferente e singular, enquanto o seu meio social é descrito de forma uniforme e homogêneo.

Desta maneira, Cascudo vai tecendo a vida de Jerônimo Rosado como se tivesse bordando, amarrando cada nó e cada ponto para que a soma dos muitos nós e dos muitos pontos possam colorir o bordado biográfico de "seu Rosado". Jerônimo seria a soma de outros Jerônimos: o colaborador social, o animador do Club Dramático Familiar[20], o professor de Química e Física do colégio Sete de Setembro, recém-chegado a Mossoró, o grande educador dos filhos, o religioso, mesmo não assumindo uma posição definida, católico ou protestante, atencioso com as crianças, caridoso com os pobres. Essas imagens que Luís da Câmara Cascudo selecionou de Jerônimo Rosado está ligada a cidade de Mossoró. Em grande medida, esses discursos imagéticos em torno de Jerônimo produzem sentidos arrolados nas imagens da própria cidade. O club e a escola, por exemplo, demonstram lugares da cidade que Cascudo evidencia em consonância com os aspectos da vida de Jerônimo, respectivamente, o animador do club e o professor.

A ficção cascudiana constrói também a imagem de um Jerônimo Rosado vestido de vida simples e moralizante, contíguo a todos desde os mais ricos aos miseráveis:

Era um oráculo inteligível pelo gesto, breve e leve, e não pela voz. Antes da resposta, o interlocutor sentia a concordância ou a reprovação. Ante seu Rosado, como diante de nenhuma outra figura da gentry(sic) mossoroense, a compostura era uma atitude obrigatória e normal. Os homens de poderio econômico, dispondo de recursos que a imaginação local tornava fantásticos, jamais desfrutaram dessa projeção respeitosa, natural e comum, para qualquer filho da cidade ou do município... Não saudava a ninguém com o gesto de mão ou pela palavra, mas retirando o chapéu, num cumprimento completo e visível.[21]

Nesse trecho, Cascudo define a personalidade de Jerônimo Rosado a partir dos seus próprios gestos: "breves" e "leves". Para ele, a voz e o gesto tinham a mesma função "transmissora", embora, Cascudo considerasse que os gestos se sobreporiam a oralidade. [22] Para ele, o ato de gesticular traduziria as próprias ideias e é por isso que ao escrever a biografia de Jerônimo Rosado, Cascudo não tenha se dedicado a analisar os discursos de Jerônimo, mas sim os seus gestos.

Para Cascudo, ao gesticular a postura do corpo de Jerônimo já emite discursos e uma posição no espaço. Segundo Yi Fu-Tuan, a postura do corpo articula uma delimitação ao espaço, ou seja, produz uma espacialidade só pelo fato de estar.[23] Jerônimo é espacializado pelo seu corpo. Ele ganha visibilidade pelos seus gestos, pela sua postura.

Para Cascudo, o corpo de Jerônimo incorporava o próprio poder, justamente por representar a aristocracia mossoroense. Para ele, é o aristocrata, e não o burguês, que impõe uma presença de poder só pelo fato de estar. Os "homens de poderio econômico" não desfrutariam, segundo ele, dessa "projeção respeitosa", exatamente por pertencerem a um grupo social que não descenderia dos laços aristocráticos da monarquia ou do império. O burguês se imporia não pela sua postura, mas sim pelo seu poderio econômico, daí a diferença que Cascudo fez questão de registrar entre "seu Jerônimo", aristocrata, e os homens de negócio. O biografado de Cascudo só pela compostura produziria poder, por isso não era necessário falar.

Ao relatar o gesto de Jerônimo em retirar o chapéu para saudar as pessoas, Cascudo o compara a Vargas: "Quem empregaria essa técnica, aliciante e gentil, havia de ser homem tão diversamente afastado de seu Rosado: - Getúlio Vargas".[24] Talvez o objetivo de Cascudo nessa comparação esteja no sentido de aludir Jerônimo enquanto uma figura de políticos protetores, preocupados com os pobres, tal como foi associada à imagem paternalista de Vargas, denominado de "Pai dos Pobres." Obviamente que essas construções em torno da imagem de ambos visam enaltecer o benemeritismo de suas realizações políticas e a sua relação com o povo, daí, talvez, esteja à explicação para a alusão de Cascudo ao associar Jerônimo à imagem de Vargas.[25]

Por conseguinte, Jerônimo Rosado é escrito por Cascudo como um itinerário de vida coerente e perfeito, um homem aprovado pela sociedade mossoroense que o respeitava e o admirava. O Jerônimo cascudiano é, portanto, um personagem romântico, sem deslizes e sem imperfeições, uma projeção idílica de homem. Contudo, sabemos que, no seu caminhar há também o movimento movediço, o impreciso, o imponderável, o descontínuo, na qual a existência humana é passível tanto de azares como de sortes, de casualidades e de oportunidades. Cascudo constrói "Jerônimos" perfeitos e coerentes que somados resultam no Jerônimo Rosado infalível.

A infalibilidade de Jerônimo vai sendo tecida por Cascudo numa cronologia de fio único que ressalta o teor coerente e imaculado de sua trajetória de vida. No capítulo III do livro, a escrita biográfica cascudiana obedece à risca a cronologia da vida de Jerônimo Rosado, narrando a história de sua família na vila de Pombal, na província da Paraíba, em 1861, até sua morte nos anos trinta em Mossoró.

Cascudo vai urdindo uma narrativa linear e cronológica como se a existência de seu biografado fosse desenrolando na medida em que o tempo fosse passando, numa dança sincrônica de quadros que organizam sequencialmente o itinerário da vida de Jerônimo.

Para iniciá-lo, Cascudo insere na epígrafe do capítulo III[26] um trecho bíblico que diz: " Saiu a semear o que semeia". A passagem bíblica açambarcada por ele visa dar uma missão a vida de Jerônimo: semear a cidade de Mossoró. Não é a toa que, para Cascudo, Jerônimo Rosado faz parte "dos grandes mossoroenses iniciais que plantaram a cidade", forasteiros que saíram de suas terras com uma missiva de semear o progresso e a civilidade na cidade de Mossoró. [27]O trecho bíblico usado por Cascudo estabelece uma visão sagrada da missão que Jerônimo tem de semear e civilizar Mossoró. Sua vida segue o mesmo itinerário de uma vida de santo. Cascudo se apropria do gênero hagiográfico para escrever a biografia de Jerônimo Rosado.

Tal como as hagiografias antigas e modernas, Cascudo estabelece uma vocação a Jerônimo. Este é considerado pelo seu biógrafo como "herói-civilizador",[28] aquele que luta a favor da cidade, "por uma estrada, do mar para os sertões, numa paciente batalha contra o desalento e o conformismo. E simultaneamente, água para a população da cidade." [29]

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[1] Doutorando em História (PPGH/UFRGS), mestre em História pelo Programa de Pós-Graduação em História e Espaços da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. É professor efetivo do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte (IFRN/MACAU).

[2] CASCUDO, Luís da Câmara. Jerônimo Rosado: uma ação brasileira na província. 3ed. Mossoró: Fundação Vingt-un Rosada, 1999. p.35 ( Coleção Mossoroense).

[3] A "servidão jubilosa" foi elaborada por Cascudo para fazer alusão ao serviço que Jerônimo Rosado e sua família prestaram a cidade de Mossoró. Idem.

[4] Infelizmente não sabemos nem o dia, nem o ano da carta de Vingt-un a Cascudo. Só sabemos do dia e do ano da resposta de Cascudo a Vingt-un. Intuímos, dessa forma, que tenha sido no mesmo ano que Cascudo respondeu a ele, isto é, em 1966.

[5] [Cartas de Luís da Câmara Cascudo a Vingt-un Rosado. 12 de agosto de 1966]. In: BRITO, Raimundo Soares de. Luís da Câmara Cascudo e a Batalha da Cultura. Mossoró:ESAM. 1986. (Coleção Mossoroense, Série C).p.82.

[6] "Os grandes mossoroenses iniciais, plantadores da Cidade, vieram de outros municípios ou foram cearenses como Almeida Castro e o vigário Antônio Joaquim, ou paraibanos como Jerônimo Rosado." CASCUDO, Luís da Câmara. Jerônimo Rosado: uma ação brasileira na província. p.51.

[7] O Boletim Bibliográfico e a Coleção Mossoroense surgiram no final dos anos quarenta em Mossoró. O primeiro era um órgão mimeografado da Biblioteca e do Museu Municipal, ambos criados em 1948, com o fim de publicar títulos sobre os diversos aspectos da sociedade mossoroense. Até o número 9 de 28 de fevereiro de 1949 tinham sido publicadas 182 páginas com uma tiragem de 100 exemplares distribuída aos estudiosos do país e a entidades culturais. O segundo, criado logo após o Boletim Bibliográfico, tinha como objetivo reunir e publicar obras sobre os mais variados temas do município mossoroense e da região adjacente a Mossoró. O MOSSOROENSE, Mossoró, 31 mar.1949.

[8] FELIPE, José Lacerda Alves. A (re)invenção do lugar: os Rosados e o "país" de Mossoró. 1°ed. João Pessoa: Grafset, 2001, p.122

[9] Além de Vingt-un Rosado, Cascudo recorre aos depoimentos de parentes da família, bem como de outros estudiosos, notadamente memorialistas.

[10] CASCUDO, Luís da Câmara. Jerônimo Rosado: uma ação brasileira na província. p.10

[11] [Cartas de Luís da Câmara Cascudo a Vingt-un Rosado. 4 de dezembro de 1966]. BRITO, Raimundo Op.cit., p.84

[12] Revista Preá, Natal, n.3, set.2003.p.39-46.

[13] NEVES, Margarida de Souza. Artes e Ofícios de um "Provinciano Incurável". Projeto História. Revista do Programa de Estudos Pós Graduados em História e do Departamento de História da PUC-SP. São Paulo: PUC-SP, n.24, p.65-86. jun 2002.

[14] BORDIEU, Pierre. Ilusão biográfica. In: FERREIRA, Marieta de Morais; AMADO, Janaína. (Org.) Usos e abusos da história oral. Rio de Janeiro: FGV, 1996, p.183-191

[15] CASCUDO, Luís da Câmara. Jerônimo Rosado: uma ação brasileira na província, p.10.

[16] Idem, p.12

[17] CASCUDO, Luís da Câmara. Jerônimo Rosado: uma ação brasileira na província. p.15

[18] DOSSE, François. O desafio biográfico: escrever uma vida. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2009, p.56

[19] CASCUDO, Luís da Câmara. Jerônimo Rosado: uma ação brasileira na província. p.10

[20] Grupo teatral responsável pela formação moral dos jovens espectadores, que esteve sob a presidência de Jerônimo Rosado de 1904 a 1906. c,p.17

[21] CASCUDO, Luís da Câmara. Jerônimo Rosado: uma ação brasileira na província. p.22-23.

[22] Idem. História dos nossos gestos. São Paulo: Melhoramentos, 1976, p.5

[23] TUAN, Yi-Fu. Espaço e Lugar: a perspectiva da experiência. São Paulo: Difel, 1983, p.39-42

[24]CASCUDO, Luís da Câmara. Jerônimo Rosado: uma ação brasileira na província, p.21

[25] PAIVA NETO, Francisco Fagundes. Mitologias do "País de Mossoró". 1997. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais) Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal-RN, p.20.

[26] Neste capítulo, Cascudo se destina a narrar cronologicamente à vida de Jerônimo Rosado. É interessante ressaltar também que o referido intelectual não nomeia os capítulos do livro, apenas recorta algum trecho ou passagem de um pensamento de algum autor ou até mesmo da bíblia.

[27] Assim como Jerônimo Rosado outros plantadores vieram a Mossoró, são eles: Almeida Castro e o vigário Antônio Joaquim. CASCUDO, Luís da Câmara. Jerônimo Rosado: uma ação brasileira na província. p.51

[28] CASCUDO, Luís da Câmara. Op.cit. p.11.

[29] Segundo Francisco Fagundes de Paiva Neto, o conceito de "herói-civilizador" remete a figura de Jerônimo Rosado por causa das campanhas desenvolvidas por ele "junto aos poderes públicos para prover a região Oeste do Rio Grande do Norte de trilhos, para escoar a produção de artigos, e a questão do abastecimento d água, estiveram em pauta em diversas discussões sobre Mossoró e projetaram Jerônimo Rosado para o panteão dos desenvolvimentistas." PAIVA NETO, Francisco Fagundes. Mitologias do "País de Mossoró". 1997. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais) Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal-RN., p.21.

Cascudo desenvolve uma narrativa em que a trajetória de vida de Jerônimo, antes de sua vinda a Mossoró, em 1889, serviu de preâmbulo para as realizações das atividades que o "herói-civilizador" desempenhará a serviço de Mossoró. É por isso que, Luís da Câmara Cascudo registra os momentos iniciais de sua vida, como, por exemplo, a sua formação em Farmácia na Faculdade de Medicina no Rio de Janeiro em 1886 a 1889.

Esse momento da vida de Jerônimo Rosado, narrado por Cascudo, se coloca como um período de formação e de provação. Seu biografado, tal como um santo e um herói épico, enfrenta várias provas, dificuldades e barreiras. Luís da Câmara Cascudo retoma a hagiografia e biografia épica como parte integrante do gênero romântico, mas provoca deslizamentos, uma vez que, tanto na hagiografia como o épico, não apresentava a ideia do indivíduo. Quando estes gêneros tratavam do sujeito/indivíduo, entendia-o na sua coletividade. Diferentemente, do romantismo que entendia o indivíduo não como uma expressão do coletivo, mas na sua singularidade. Desta maneira, a escrita biográfica de Cascudo é ambígua: ao mesmo tempo em que Jerônimo Rosado é singular em relação aos mossoroenses, pois ele é descrito como expressão dessa sociedade.

As provações encontradas por Jerônimo se integram ao conjunto de dificuldades que ele terá de enfrentar no Rio de Janeiro. Para descrever essas provações, Cascudo mobiliza vários recursos estilísticos no qual assentam a estrutura de sua narrativa sobre uma série de contraposições que tem uma base comum: a oposição entre duas realidades culturais e geográficas, o Rio de Janeiro cosmopolita e o sertão rude, presente no temperamento e nas posturas de Jerônimo[30]: "O desajustamento do seu temperamento com aquela alegria sonora da cidade povoada de boêmios, serenatas e lirismos noctívagos. Era um sertanejo sem lamúrias, sem intimidades, sem pedidos insistentes." [31]

Novamente, o estilo biográfico cascudiano constrói uma dada leitura da vida de Jerônimo Rosado a partir da antítese, agora, fincada no aspecto espacial. Jerônimo Rosado representaria, para Cascudo, o sertão culturalmente intocado, original, sinônimo de autenticidade e de brasilidade, contraposto ao litoral, associado à ideia de cosmopolitismo, artificialidade, manchado pelas vicissitudes externas. Essa forma de conceber as distintas representações espaciais, no que tange a concepção de formação social brasileira presentes na escrita cascudiana, está associada às várias influências que Cascudo teve durante os anos vinte do movimento modernista paulista, de Plínio Salgado e Mário de Andrade, em consonância com o movimento integralista de 30 que o próprio Luís da Câmara Cascudo participou no Rio Grande do Norte, como também do movimento regionalista e tradicionalista de Gilberto Freyre, José Américo de Almeida e José Lins do Rego.[32] Embora estes movimentos literários tenham pontos divergentes em relação ao modo de pensar a questão da representação do nacional, Cascudo soube conciliar várias dessas visões distintas, reelaborando-as para o seu próprio benefício. Uma delas está ligada ao sertão e o seu tipo social, o sertanejo.

Cascudo compara a vida típica do Rio de Janeiro, envolvente, sedutor, com Jerônimo Rosado, justamente para tratá-lo como uma metonímia do sertão que resistia às provações de uma sociedade "tentadora" cercada de um crescente cosmopolitismo que acoplava cerca de meio milhão de habitantes, mas que não atordoava nem estarrecia Jerônimo. Em vez de se integrar ao conjunto sedutor da metrópole tropical, suja, brilhante, acolhedora, inesquecível, de famílias ricas que davam festas deslumbrantes, Jerônimo, visto por Cascudo, não bebia, não jogava, não fumava. Ao invés da boemia carioca, estudava hebraico na madrugada, no recôncavo do seu quartinho de pensão humilde, sem mesa, estirando a roupa amarfanhada com uma garrafa.[33] Jerônimo seria o autêntico sertanejo e, portanto, aquela figura "original", quase intocada pelas transformações trazidas pela modernidade e pela sociedade burguesa, tal como pensavam algumas vertentes do modernismo paulista[34] e também do regionalismo-tradicionalista.[35]

Segundo o historiador Raimundo Arrais, ao relatar sobre a vida de Jerônimo Rosado no sul, Cascudo revela uma empatia que o aproxima do seu biografado. Assim como ele, Cascudo realizou uma viagem, absorvendo uma cultura universal, mas se recusou diante das oportunidades de viver fora de sua Natal provinciana.[36] Jerônimo é o espelho de Cascudo. O biógrafo acaba possuído pelo biografado.[37] Luís da Câmara Cascudo escolhe dadas imagens de Jerônimo porque se parece com ele. Para o intelectual, Jerônimo Rosado esteve imbuído do mesmo sentimento do provincianismo que o fincou em Natal, pois, assim como ele, o jovem Rosado, depois de formado, deixara o sul para sua missão na província daí a justificativa do título da biografia: Jerônimo Rosado: uma ação brasileira na província. Para Cascudo era ao sertão e não ao Rio de Janeiro que Jerônimo destinaria sua vida e seu ofício de Farmacêutico:

Terminara a etapa. Olhava, enamorado, a Carta de Farmacêutico. Para ela e não para o Rio de Janeiro envolvente, o Sul sedutor, volvia a esperança do trabalhador. A demora em voltar era o exame para o reajustamento no sertão legítimo, abrindo novo ciclo na vida esforçada. Não lhe passou pela cabeça continuar no Rio de Janeiro, agora titulado num curso superior. Trazer a Sinhazinha para a capital do Império. Aquele azimute de marcha orientava-se para as coordenadas geográficas do Catolé do Rocha, partindo da Guanabara. E não o inverso, o lógico, humano e natural para os vinte e sete anos sólidos e o bigodinho de poeta romântico.[38]

Para Cascudo, a vida de Jerônimo no Rio de Janeiro serviria como provação e preparação para a sua ação na província, agenciando elementos para o seu regresso ao Norte, daí a demora em voltar era o exame para o reajustamento no sertão. A longa formação em Farmácia na Corte vai ser, para Cascudo, a primeira forma de contribuição de Jerônimo Rosado para o serviço em favor da província, ou seja, civilizá-la

A biografia de Jerônimo é um relato de viagem, uma geografia do sagrado. O texto de Cascudo sobre Jerônimo circula em torno de um lugar: a província. A vida de Jerônimo é dividida, entre uma partida e um retorno. De modo semelhante aos hagiógrafos antigos e modernos, Cascudo institui uma vocação a Jerônimo. Tal como os santos que se exilam de um espaço primeiro para conduzi-lo a um espaço outro, no qual sofre provações, o Jerônimo Rosado cascudiano sai da Paraíba para ser provado no Rio de Janeiro para cumprir sua missão em Mossoró. Este esquema, segundo Michel de Certeau, permite introduzir os leitores no movimento do texto, produz uma leitura itinerante, uma geografia do sagrado, no qual conduz o santo ao lugar enunciado, isto é, o espaço em que a missão se cumprirá.[39]

A característica benemérita e civilizatória atribuída ao jovem Rosado por Cascudo é apresentada como demonstração do seu amor a terra. Para o intelectual o sentimento telúrico e o benemeritismo justificam a volta de Jerônimo Rosado em 1889, ao Norte, mais precisamente, a Catolé do Rocha, cidade de sua noiva, Maria Amélia Henriques Maia.

Mesmo residindo primeiramente em Catolé do Rocha, a província de Jerônimo Rosado não era a Paraíba. O destino de sua vida estava além das terras paraibanas. Cascudo narra o momento da vinda de Jerônimo Rosado a Mossoró em 1889 quando aceitou o convite para instalar em 1890, juntamente com Almeida Castro, uma farmácia na cidade. Para Cascudo é nesse momento que Jerônimo Rosado começa sua missão de civilizar Mossoró.

Luís da Câmara Cascudo descreve que a motivação de Jerônimo em residir em Mossoró esteve estreitamente ligada ao momento do empório comercial e do surto econômico que a cidade estava vivendo em fins do século XIX. Vejamos:

Irá para uma cidade funcionalmente capital de toda a região limítrofe além de todo o oeste norte-rio-grandense. O porto do mar, Areia Branca, onde despeja o rio Apodi-Mossoró, é o escoadouro natural das matérias-primas. O comércio local supre pedidos do sertão inteiro. Tem-de-tudo, com abundância, variedade, modernice. E é mercado comprador dos produtos enviados nos intermináveis comboios, vindo dos sertões de Pernambuco e da Paraíba.Vende tudo e compra tudo em condições de pagamento imediato, em espécies ou mercadorias (...) A família dos Maias estendia, tenaz e amorosamente, uma raiz invencível para o Mossoró, através de Jerônimo Rosado, para replantar-se e reflorir, perenemente.[40]

Motivado pelo dinamismo econômico de Mossoró no final do século XIX, segundo Cascudo, Jerônimo Rosado é descrito pelo intelectual como um indivíduo que se interessa pela terra, fincando-se como uma "raiz invencível". Ao enunciar que "seu Rosado" saiu da Paraíba e se enraizou em Mossoró, Luís da Câmara Cascudo está legitimando o enraizamento dos "herdeiros de Jerônimo Rosado" que até hoje parecem invencíveis em Mossoró.

Cascudo constrói uma narrativa que endossa a "permanência invencível" dos Rosados na cidade a partir de Jerônimo Rosado. É a ação dele em Mossoró que interessa a Cascudo, daí, porque destina um capítulo inteiro, o quarto, para justamente discorrer sobre as contribuições que Jerônimo deu a cidade.

Mais uma vez, Cascudo se apropria da linguagem bíblica para narrar à "sagrada" vida de Jerônimo: "E no alto plantarás a tenda". Agora, sua escrita registra a vivência do seu biografado em Mossoró.

Em meio a conjuntara de empório que a cidade vivia, no final do século XIX, marcada pelo fluxo de pessoas e serviços advindo de toda a região limítrofe da província do Rio Grande do Norte e de outras praças, Jerônimo Rosado, para Cascudo, contribuiu fundamentalmente para a vinda do progresso e da civilização a Mossoró, "plantando" o ensino, a saúde e a vida política na cidade.

Cascudo mostra que a formação em Farmácia na faculdade da Corte possibilitou a Jerônimo Rosado prestar serviços a Mossoró como, por exemplo, na educação ao lecionar Física e Química no Colégio Sete de Setembro no início do século XX, sendo considerado o "primo-motor" da educação secundarista da cidade, e o de farmacêutico, que fazia experimentos e produzia medicamentos, como por exemplo, o antinevrálgico Rosado, a viperina, o peitoral de Joatonka, o elixir anti- asthmatico, o elixir anti-sezonatico, para o consumo da gente da cidade e de outros Estados como o Ceará e Pernambuco. Cascudo registra que as criações farmacêuticas de Jerônimo Rosado renderam-lhe em 1908 a Medalha de Ouro e Menção Honrosa na Exposição Internacional de 1922, ambas no Rio de Janeiro.[41]

O Jerônimo professor e farmacêutico lançaram as bases, segundo Cascudo, para outra ação na "província": a política. É interessante que ao relatar sobre a participação política de Jerônimo Rosado em Mossoró, Cascudo tenta despolitizá-lo. Ele faz crer que na cidade havia um vazio político, pois ninguém constituiu um domínio político. Mossoró seria uma cidade sem um enraizamento político, pronta para receber as sementes políticas trazidas pelos plantadores forasteiros como, por exemplo, Jerônimo Rosado. No mesmo período, início da República, Natal, diferente de Mossoró, teria uma organização política alicerçada em bases mais sólidas, tendo em vista que a capital norte-rio-grandense era dominada pelos Albuquerque Maranhão.[42] Embora apresente Jerônimo Rosado como republicano, segundo Cascudo, seu biografado foi o menos político dos homens.[43]

Para Luís da Câmara Cascudo o que levou Jerônimo Rosado a participar da vida pública em Mossoró durante o regime republicano, não foram suas ideias coadunadas com a nova organização política, mas sim o sentimento telúrico, pois "o que realmente lhe interessava era Mossoró". É por isso que Cascudo atrelava a vida política de Jerônimo mais a amizade que ele tinha com o Doutor Castro, que era republicano, do que as convicções partidárias republicanas:

Politicamente, o mesmo critério unitário e medular, presidirá a vida clara e simples. Almeida Castro é o amigo orientador. Não tem desejos, ambições, amarguras, decepções. Acompanhará (sic) o doutor Castro pelos caminhos que este escolher. Serão dignos de suas pegadas fiéis, deixando o exemplo na pedra para que os filhos vejam a direção coerente e serena. Ao votar, pela primeira no Mossoró republicano, manhã de 11 de setembro de 1892, votou ouvindo (sic) Castro. Sua missão individual seria outra.[44]

Vincular os laços de amizade entre Almeida Castro com Jerônimo Rosado tem um claro objetivo de despolitizá-lo. Essa menção de Cascudo pode ser entendida a partir da sua própria maneira de pensar a política a partir das práticas das relações pessoais, depreciando os moldes republicanos de se fazer política, uma vez que Cascudo era simpatizante do regime monárquico. A república, para ele, representaria uma das transformações no cenário político que escamoteou a tradição política do império fazendo desaparecer um passado calcado na tradição que é apresentado por ele através do signo da monarquia, agora, decadente pelas vicissitudes da República, caracterizada pelas disputas pelo poder a partir do interesse pessoal, do benefício próprio, individual. Sua visão de política é negativa, sobretudo, aquela ligada a política partidária, a democracia liberal. Por isso elogia regimes centralizados, autoritários, como a monarquia. O discurso político de Cascudo se constrói em nome da despolitização. Ele elogia a política dos melhores, dos mais capacitados, por isso critica a democracia liberal, porque escolhe qualquer um, não necessariamente os melhores. Desse modo, a política para Cascudo é destinada para alguns, uma visão antiga de poder, semelhante, ironicamente, a República de Platão.

Embora, tenha descrito Jerônimo Rosado como republicano, ou segundo ele, "dizia-se republicano", seu biografado não representaria essa tendência política, ele é apresentado a partir do benemérito, do serviço prestado a cidade, ação que, para Cascudo, não advém das ligações no campo do poder, mas sim da ação telúrica e do comprometimento em plantar a cidade. É por isso que Cascudo despolitiza Jerônimo, exatamente, para descrever uma ação cosida no apego a terra, no provincianismo, e não por projeção pessoal. É por isso também que faz questão de registrar que Jerônimo Rosado não participou da revolução de 1930, pois o seu compromisso seria o serviço a cidade e não o interesse próprio:

Quero ressaltar um pormenor. Rosado não apelou para o civismo dos "autênticos" de 1930 como não discursara aos amotinados de 1921. Sentia-se com a credencial da confiança coletiva quem estava ao serviço de Mossoró desde 1890.[45]

O Jerônimo cascudiano assume, desta maneira, ares de herói, aquele que abre mão de sua individualidade em prol de "lutar" pelos outros, sem pragmatismos, totalmente despolitizado, comprometido mais com a coletividade do que com os seus interesses próprios. E foi no início do século XX que, segundo Cascudo, Jerônimo revelaria sua missão de herói-civilizador: "Seriam trinta anos de labor, tenacidade sem pausa, mais do que prometia a força humana" [46] O Jerônimo Rosado cascudiano teria a imagem do homem providencial, um herói e mito[47], uma figura simbólica como uma visão coerente e completa, no qual o destino coletivo dos cidadãos mossoroenses seria afetado pela sua missão civilizadora. Cascudo, o tempo todo constrói uma dada leitura que institui um Jerônimo que suplanta a própria limitação humana em serviço a cidade. É nesse sentido que ele se arvora de passagens bíblicas, como mostramos anteriormente, para narrar à "Missão" de Jerônimo Rosado. Novamente, seu biografado aparece com o destino de vida que se quer crer num ensaio de trajetória "transcendental" que esquiva a dimensão humana para desenhá-la como sobrenatural.

Essa "Missão", para Cascudo, residiria na "Curiosidade" de Jerônimo Rosado para trabalhar, construir e realizar as ações para a cidade de Mossoró. Impulsionado pela curiosidade, como fruto de sua própria condição humana, o Jerônimo cascudiano envereda pela vida pública, mesmo sendo o "menos político dos homens", tornando-se membro da Intendência Municipal no triênio de 1908-1910, e ocupando, posteriormente, a posição de presidência entre 1917 a 1919. É nesse momento que, segundo Cascudo, Jerônimo Rosado desempenha a sua grande missão a favor de Mossoró: "a batalha pela conquista d água."[48]

O último capítulo da biografia se encerra exatamente no instante em que Jerônimo Rosado passa a lutar pela água em Mossoró. O capítulo V é inteiramente dedicado a narrar à questão da falta d água na cidade e como Jerônimo lutou para solucionar esse problema.

Para Luís da Câmara Cascudo, "a história do povo nordestino é a batalha pela conquista d água".[49] A construção da identidade nordestina esteve atrelada ao fenômeno das secas, como assinalou o historiador Durval Muniz de Albuquerque Júnior: "O Nordeste é, em grande medida, filho das secas".[50] Nesse sentido, Cascudo fez parte dessa construção imagético-discursiva que através da escrita da história, da literatura, das crônicas e de outros domínios da escrita e das artes, instituíram uma identidade para o Nordeste e para o nordestino. A seca vai ser o ponto de partida para a urdidura desse recorte geográfico que no início do século XX em diante configura a antiga geografia naturalista que dividia o país em Norte e Sul.[51] Daí, a utilização por Cascudo da falta d água como agente justificador da história do povo nordestino.

Em Mossoró no final do século XIX e início do XX, assim como no restante da região Norte, e, posteriormente, nos Estados do Nordeste, a seca vai ser a principal luta pela qual as elites afetadas por ela reivindicam a Federação a canalização de recursos para o combate desse problema.

Durante a administração de Jerônimo Rosado junto a Intendência Municipal no início do século XX, a principal reivindicação para a resolução do problema da falta d água em Mossoró se dava pela construção de açudes e barragens tal política partia do entendimento de que a problemática da região era a falta d água por estiagens prolongadas ou pela má distribuição das chuvas.[52] Segundo Luís da Câmara Cascudo, outros elementos importantes para a resolução da seca foram sendo agenciados por Jerônimo Rosado juntamente com as elites locais, como, por exemplo, a construção da estrada de Ferro Mossoró - São Francisco, do açude Taboleiro Grande e a criação de escolas.[53]Vejamos:

Ficaram reunidos os homens de boa-vontade. Não há um telegrama, relatório, mensagem, sem o nome de Jerônimo Rosado. Incluímos a correspondência privada, quase toda nesse sentido, expondo, debatendo, pedindo água. Não calculo a estatística. Algumas centenas de folhas.

Resumindo. As duas campanhas (Combate as secas de 1904 e 1908-grifo nosso) evidenciam, no tempo, o muito insistentemente foi pedido e o muito-pouco conseguido, mas aplicado, total e conscientemente ao serviço de Mossoró e do povo ali abrigado.[54]

Luís da Câmara Cascudo vai destinando a Jerônimo Rosado um lugar de liderança junto à elite, tornando-o centro gravitacional da bandeira de luta contra a seca e também pela civilidade, tendo em vista que para essa elite, a Estrada de Ferro, a solução do problema do abastecimento d água e a instrução dos jovens, são elementos vitais para a construção da realidade civilizada, muito embora, essas reivindicações estejam se apropriando do discurso da miséria e da seca.[55]

A ideia de "herói-civilizador" atribuída a Jerônimo Rosado vai se configurando como uma construção identitária que liga a história de Mossoró ao fenômeno da seca e, desse modo, aos "plantadores da cidade", como o próprio Jerônimo, que vão sendo posicionados como sujeitos dessa história. Como faz crer Cascudo:

Muito palidamente marcarão a intensidade sonhadora do provinciano enamorado de sua missão, na mesma pista obstinada durante anos incontáveis, para obter resultados aparentemente irônicos, comparando-os à sua miraculosa tenacidade. Lenta e distraidamente soa a frase leve: - "Ah! é verdade, seu Rosado trabalhou muito pelo abastecimento d água em Mossoró..."

Esse muito (sic) será um pobre adjetivo incapaz de sugerir a percepção da continuidade no rumo do trabalho.[56]

A continuidade do trabalho realizado por Jerônimo Rosado a serviço de Mossoró é construída pela escrita cascudiana como um elo do biografado com o itinerário dos seus próprios filhos. Não é a toa que Cascudo evidencia o papel que eles têm na construção desse continuísmo da ação de Jerônimo em Mossoró que desde a educação dos seus filhos-meninos, já ensinava a imitar seguindo o seu exemplo.[57]

Jerônimo Rosado lançaria as bases da própria batalha da água evidenciada na proposta e na campanha de seu filho Dix-sept Rosado durante os anos quarenta e cinquenta em Mossoró. Ao mencionar Jerônimo como o "pioneiro" da luta pela água, Cascudo constrói uma identidade para as ações de seus filhos, justificando a partir da escrita da história e da biografia a legitimação do poder político, buscando no passado as origens das ações no presente.

Conclusão

Mais do que escrever sobre a vida de Jerônimo, a escrita cascudiana constrói uma identidade entre o biografado e a cidade de Mossoró, tornando-lhe o "plantador da cidade", construído discursivamente por Cascudo, o "Jerônimo" dele, possível somente na sua escrita. Um Jerônimo de traçado coerente, devotado e telúrico em seu serviço a Mossoró, cujo sentido de vida, Cascudo constrói para se confundir numa mesma tessitura, os "nós" do bordado que ponteia a história da cidade de Mossoró com a história de vida de Jerônimo Rosado.

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[30] ARRAIS, Raimundo. Jerônimo Rosado (1861-1930): uma ação brasileira na província. In: SILVA Marcos, Dicionário crítico de Câmara Cascudo. (Org). São Paulo: Perspectiva, FFLCH/USP: Fapesp; Natal: EDUFRN. Fundação José Augusto, 2003, p.144

[31] CASCUDO, Luís da Câmara. Jerônimo Rosado: uma ação brasileira na província. p.39

[32] Cf. SALES NETO, Francisco Firmino. Palavras que silenciam: Câmara Cascudo e o regionalismo-tradicionalista nordestino. João Pessoa: Ed. Universitária UFPB, 2008

[33] CASCUDO, Luís da Câmara. Jerônimo Rosado: uma ação brasileira na província. p.37.

[34] Cf. VELLOSO, Monica Pimenta. O modernismo e a questão nacional. In: FERREIRA, Jorge; DELGADO, Lucila de Almeida Neves (Org.). O Brasil Republicano. V. 1. da Proclamação da República à Revolução de 1930. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003.

[35] Cf. ALBUQUERQUE JÚNIOR, Durval Muniz de. A Invenção do Nordeste e outras artes. 4º ed. São Paulo: Cortez, 2009.

[36] ARRAIS, Raimundo. Jerônimo Rosado (1861-1930): uma ação brasileira na província. In: SILVA Marcos, Dicionário crítico de Câmara Cascudo. (Org). São Paulo: Perspectiva, FFLCH/USP: Fapesp; Natal: EDUFRN. Fundação José Augusto, 2003, p.146

[37] DADOUN apud DOSSE. O desafio biográfico: escrever uma vida. p.14

[38] CASCUDO, Luís da Câmara. Jerônimo Rosado: uma ação brasileira na província. p.4

[39] CERTEAU, Michel de. A escrita hagiográfica. In: A escrita da História. 2ºed. Rio de Janeiro: Forense Universitária. 2007, p.278

[40] CASCUDO, Luís da Câmara. Jerônimo Rosado: uma ação brasileira na província. p.48 e 49.

[41] CASCUDO, Luís da Câmara. Jerônimo Rosado: uma ação brasileira na província. p.63

[42] Cf. BUENO, Almir de Carvalho. Visões de República: ideias e práticas políticas no Rio Grande do Norte (1880-1895). Natal:EDUFRN, 2002

[43] CASCUDO, Luís da Câmara. Jerônimo Rosado: uma ação brasileira na província. p.53

[44] Idem. p.56

[45] CASCUDO, Luís da Câmara. Jerônimo Rosado: uma ação brasileira na província. p.30

[46] Idem. p.66

[47] Para Raoul Girardet uma das características do espaço mitológico é a presença de herói. Girardet apresenta quatro modelos de heróis, exemplificado, por personagens da história, como, por exemplo, Napoleão Bonaparte, Philippe Pétain, Charles de Gaulle, dentre outros. Girardet analisa como a imagem de herói, apropriado por representantes políticos, constrói uma visão mítica de uma dada personalidade desde o período moderno até a contemporaneidade. Cf. GIRARDET, Raoul. Mitos e mitologias políticas. São Paulo: Companhia das Letras, 1987. p.70-80

[48] CASCUDO, Luís da Câmara. Jerônimo Rosado: uma ação brasileira na província. p.67

[49] Idem.

[50] ALBUQUERQUE JÚNIOR, Durval Muniz de. A Invenção do Nordeste e outras artes. p.81

[51] Idem.

[52] FELIPE, José Lacerda Alves. A (re)invenção do lugar: os Rosados e o "país" de Mossoró. p. 77

[53] CASCUDO, Luís da Câmara. Jerônimo Rosado: uma ação brasileira na província. p.66-75

[54] Idem. p.71

[55] FELIPE, José Lacerda Alves. A (re)invenção do lugar: os Rosados e o "país" de Mossoró. p. 77

[56] CASCUDO, Luís da Câmara. Jerônimo Rosado: uma ação brasileira na província. p.75

[57] Idem. p.17-18





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