sábado, 4 de fevereiro de 2012



Morreu Beatriz Bandeira Ryff, a última sobrevivente da Cela 4

9/Janeiro/2012

Morreu, aos 102 anos, Beatriz Bandeira, a última sobrevivente da famosa Cela 4 – onde foram presas, na Casa de Detenção, no Rio de Janeiro, então Distrito Federal, as poucas mulheres que participaram da revolta comunista de 1935 no Brasil.



Foi na Cela 4 que ficaram confinadas Olga Benário (esposa do líder da intentona, Luiz Carlos Prestes), a futura psicanalista Nise da Silveira, a advogada Maria Werneck de Castro e as jornalistas Eneida de Moraes e Eugênia Álvaro Moreyra.



Por conta dessa passagem, Beatriz virou personagem de livros como “Memórias do Cárcere”, o relato biográfico de Graciliano Ramos, que também esteve preso por causa da revolta.



Pouco antes, como militante comunista e da Aliança Nacional Libertadora (ANL), Beatriz conheceu seu marido, Raul Riff, jornalista, que viria a ser secretário de Imprensa do governo João Goulart (1961-1964). Com ele se casou três vezes.



Os dois foram exilados duas vezes. Em 1936, depois da libertação, foram expulsos para o Uruguai. Em 1964, após o golpe militar, receberam abrigo na Iugoslávia e, posteriormente, na França.



Ao regressar ao Brasil, Beatriz continuou a militância política nos anos 70 e 80. Foi uma das fundadoras do Movimento Feminino pela Anistia e Liberdades Democráticas, que lutou pelo fim da ditadura no País.



Beatriz nasceu em uma família positivista. Seu pai, o coronel do exército Alípio Bandeira, foi abolicionista. Militar, trabalhou no Serviço de Proteção ao Índio (SPI) e ajudou o Marechal Cândido Rondon na instalação de linhas telegráficas no interior do País e no contato com tribos isoladas – Alípio liderou o encontro com os Waimiri Atroari em 1911, por exemplo.



Além de militante política, Beatriz foi poeta (publicou “Roteiro” e “Profissão de Fé”) e professora (foi demitida pelo regime militar da cadeira de Técnica Vocal do Conservatório Nacional de Teatro). Também escreveu crônicas e colaborou para o jornal A Manhã e as revistas Leitura e Momento Feminino.



Há dez anos ela contou um pouco de sua história em uma entrevista à TV Câmara.



Beatriz morreu na noite de segunda (dia 2) após um AVC. Foi enterrada no final da tarde de hoje (dia 3) no Cemitério São João Batista, em Botafogo.



***

UMA NOTA PESSOAL

Beatriz Bandeira Ryff era minha avó. Nos últimos anos de sua vida centenária a senilidade tinha lhe tirado totalmente a visão. Ela quase não falava e mal se comunicava com o mundo.

Há uns dez dias, fui visitá-la levado pelo meu filho de 8 anos que queria dar um beijo na “bisa”. Encontramos ela mais presente do que em todas as visitas nos anos anteriores. Chegou a cantarolar algumas músicas que costumava embalar o sono dos netos quando pequenos, como os hinos revolucionários “Internacional”, “A Marselhesa” (embora ela também cantasse obras não políticas, entre elas a “Berceuse”, de Brahms).



Ao me despedir, perguntei-lhe se lembrava o trecho do poema “Canção do Tamoio”, de Gonçalves Dias, que ela costumava recitar. Ela assentiu levemente com a cabeça e começou, puxando do fundo da memória. Foram suas últimas palavras para mim.



“Não chores, meu filho;

Não chores, que a vida

É luta renhida:

Viver é lutar.

A vida é combate

Que os fracos abate,

Que os fortes, os bravos,

Só pode exaltar.”

(“Canção do Tamoio”, Gonçalves Dias)





Luiz Antonio Ryff


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Manoel Messias Pereira

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