Grupo da Unesp descobre novo material com propriedade bactericida
Jornal do Brasil
Pesquisadores do Instituto de Química da Universidade Estadual Paulista (Unesp), em Araraquara, descobriram um material com propriedades bactericida, fotoluminescente e fotodegradante que poderá ter aplicações importantes em muitas áreas, como na indústria de alimentos. A pesquisa foi publicada nesta quarta-feira (17/04) na revista Scientific Reports do grupo Nature.
O grupo, que também faz parte do Centro Multidisciplinar para o Desenvolvimento de Materiais Cerâmicos (CMDC) – um Centro de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPID) da FAPESP, conseguiu obter filamentos de prata metálica em um composto formado por óxido de prata e tungstênio (chamado de tungstato) a partir de uma nova rota de síntese do material.
“Esses filamentos têm propriedades aumentadas em relação ao material convencional e foram obtidos por meio de uma rota inusitada, até então inédita e sem descrição na literatura científica”, disse Elson Longo, um dos autores do artigo, à Agência FAPESP. O estudo também contou com a participação de cientistas do Departamento de Química da Universidade Federal de São Carlos e da Universitat Jaume I, na Espanha.
Longo é coordenador do CMDC e do Instituto Nacional de Ciências e Tecnologia dos Materiais em Nanotecnologia (INCTMN), também apoiado pela FAPESP, ambos com sede no Instituto de Química da Unesp. Nos últimos dois anos, Longo e outros pesquisadores do CMDC iniciaram um projeto para entender a origem de algumas propriedades ópticas – como a fotoluminescência – apresentada pelo tungstato de prata por meio de microscópios eletrônicos de varredura de alta resolução e de transmissão.
Durante o estudo, o grupo verificou um crescimento exponencial de filamentos de prata metálica em escalas nanométrica (bilionésima parte do metro) e micrométrica (milionésima parte do metro) em diferentes regiões da superfície de cristais de tungstato.
“Em um primeiro momento, achamos que os filamentos eram de carbono. Depois de cinco meses de trabalho de análise das amostras de cristais de tungstato, constatamos que, de fato, cresciam filamentos de prata na superfície do material”, contou Longo.
Ao estudar os mecanismos de crescimento e as propriedades fotoluminescentes dos filamentos de prata, por meio de um projeto realizado com apoio da FAPESP, os pesquisadores identificaram que os elétrons dos microscópios de varredura e de transmissão que incidem nos cristais de tungstato induziam uma reação química no material que possibilitava o crescimento dos filamentos de prata metálica.
Segundo Longo, a interação dos elétrons gerados pelos microscópios – principalmente os de varredura, cujas partículas são mais energéticas – com os íons de prata do tungstato promove a redução a prata metálica. “Vimos os filamentos de prata metálica crescerem no tungstato de forma clara em uma sequência curta de imagens. Essas imagens estão publicadas na internet no artigo naScientific Reports”, contou Longo.
“Quanto maior o tempo de interação entre os elétrons com os íons de prata, maior é o crescimento dos filamentos de prata metálica, e é possível observar esse fenômeno por meio de microscópio de varredura ou de transmissão”, explicou.
De acordo com os pesquisadores, o efeito de eletrossíntese de filamento de prata que observaram tem semelhanças com a reação que provoca o efeito fotoelétrico descrito por Albert Einstein (1879-1955) em 1905 e que rendeu o prêmio Nobel de Física ao cientista alemão em 1921.
Enquanto no efeito fotoelétrico é o fóton de uma radiação eletromagnética – como a luz – que, ao incidir sobre metal, pode ejetar elétrons do material, dependendo de sua energia, no caso do efeito de eletrossíntese é o elétron que, ao incidir sobre um material metálico – neste caso, o tungstato –, provoca uma reação química de redução-oxidação, ou redox.
“Esse fenômeno – que denominamos no artigo de ‘síntese de filamento de prata dirigido por elétrons’ – é muito inovador e até então ninguém havia conseguido explicá-lo”, disse José Arana Varela, professor titular do Instituto de Química da Unesp e um dos autores da pesquisa e do artigo.
“No artigo agora publicado, explicamos como essa reação redox é induzida pelos elétrons irradiados pelo microscópio de varredura e de transmissão”, afirmou Varela, que também é diretor-presidente do Conselho Técnico-Administrativo da FAPESP.
Novo material
Segundo os pesquisadores da Unesp, outros grupos de pesquisa internacionais já haviam conseguido obter filamentos de prata metálica a partir do tungstato de prata, mas isso por rotas de síntese do material totalmente diferentes da que utilizaram. Uma dessas rotas é a hidrotérmica, com a aplicação de pressão e temperatura para se obter o produto.
Mas até então não havia se tentado obter o material por meio da irradiação de elétrons em tungstato – como fez o grupo brasileiro –, que aumenta as propriedades fotoluminescente, fotodegradante e bactericida dos filamentos de prata metálica em comparação ao mesmo produto obtido por meio de um processo diferente.
“Esse novo material apresenta vantagens em relação aos métodos bactericidas atuais, nos quais se deposita prata em materiais – como polímeros – para conferir a eles essa propriedade”, disse Longo. “A irradiação com elétrons aumenta a propriedade bactericida dos filamentos de prata três vezes em comparação ao método atual de deposição.”
Por causa dessa propriedade, a tecnologia, para a qual o grupo solicitou patente, começou a despertar o interesse de fabricantes de materiais bactericidas para o desenvolvimento de embalagens de alimentos. Outras possíveis aplicações do novo material estão na fotodegradação de compostos orgânicos na água e nas áreas de cerâmica, microeletrônica e química.
“Agora, estamos estudando como fazer crescer esses filamentos de prata metálica em outros sistemas, como molibdatos. Já verificamos que nos molibdatos o material cresce utilizando um processo semelhante. Queremos ver qual limite de energia dos elétrons é suficiente para induzir essa reação e se eles melhoram as aplicações dos sistemas existentes”, disse Varela.
Agência Fapesp
Tags: ciência, fapesp, pesquisa, saúde, tecnologia
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