quarta-feira, 11 de abril de 2012
A discriminação racial sob uma ótica econômica
Ao analisar a discriminação racial sob uma ótica econômica, o economista Gustavo Andrey de Almeida Lopes Fernandes constatou que existe, no Brasil, uma elite branca, formada majoritariamente por brancos e amarelos, de um lado, e uma pobreza geral, composta por brancos, negros, pardos e amarelos, de outro. Isso se deve, principalmente, ao capital humano que é um conjunto de fatores ligados à educação, localização e experiência, entre outros aspectos que valorizam a pessoa no mercado de trabalho. “Em São Paulo, estudar em escola privada é o fator de capital humano que mais aumenta os salários”, afirma Fernandes.
De acordo com o economista, essa configuração cria um ciclo vicioso em que apenas alguns brancos e amarelos têm uma escolaridade melhor e ganham salários mais altos, e, portanto, podem colocar seus filhos em escolas privadas. Em seu estudo de doutorado Os aspectos econômicos da discriminação racial no Brasil, realizado na Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA) da USP, ele constata que o grande problema do País é a falta de capital humano, que predomina em todas as raças. Ao contrário de pretos e pardos, contudo, há entre os brancos uma pequena elite branca, que eleva as médias salariais da grande maioria do grupo. Dessa forma, a discriminação racial é um problema econômico menor diante dessa configuração social.
O economista analisou os fatores causadores da diferença de salários existente entre as raças, levando em conta os erros de mensuração que podem existir. Fernandes procurou diferenciar aquilo que é decorrente de disparidades de capital humano, ou seja, aspectos que valorizam a pessoa na questão salarial, daquilo que é, de fato, fruto do preconceito racial.
O estudo, que foi orientado pelo professor Denisard Cneio de Oliveira Alves, utilizou dados do Censo de 2000, da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) e de escolas do ensino fundamental da cidade de São Paulo. Além dessas informações, também foram feitas revisões da literatura acadêmica sobre as questões econômicas da discriminação racial.
Capital humano dos brancos justifica salário 42% maior em relação a pardos e negros
Capital humano
O estudo pode ser dividido em três partes. Na primeira, foi estimado o impacto no salário dos diferentes aspectos do capital humano. Além disso, foi levado em conta nas estimativas do diferencial de salários entre brancos e não brancos o erro por causa da forma que é feita a divisão racial: cada pessoa se autodenomina de uma raça definida arbitrariamente, mas que, a rigor, não é necessariamente a maneira como os outros o veem. Desse cálculo, levando em consideração o erro da autodenominação, pode-se constatar que o valor médio do salário do branco deve ser 42% maior que de um negro ou pardo, devido ao capital humano médio que cada grupo possui.
Esse contraste, contudo, não pode ser considerado inteiramente como consequência do preconceito racial. Ele é também um reflexo da desigualdade entre os valores de capital humano que os grupos têm em média. Na hora de escolher um empregado, quando o empregador tem poucas informações sobre os candidatos, a opção pelo branco seria pela maior probabilidade de ele ser mais qualificado do que o pardo ou negro. O economista nomeia esse fenômeno de discriminação estatística.
Entretanto, para o pesquisador, a metodologia de mensuração da discriminação tem algumas ressalvas: existe a falta de dados qualitativos sobre alguns fatores do capital humano. Por exemplo, no Censo está descrito o nível de escolaridade das pessoas, mas a qualidade das escolas e faculdades não é levada em conta. Além disso, o agrupamento de negros e pardos como um grupo só, em todo o Brasil, não é realístico considerando as diferenças de como as pessoas são vistas em cada região.
Na segunda parte do trabalho, dividiu o País em regiões para um estudo mais específico. Utilizando dados da PNAD, notou diferenças salariais entre pardos e negros no nordeste e sudeste (menos o Estado de São Paulo), enquanto em São Paulo e no sul não havia mudanças relevantes entre esses dois grupos. As regiões norte e centro-oeste não foram contabilizadas por não existirem informações suficientes sobre elas nas pesquisas utilizadas.
O economista percebeu então que a hipótese de preconceito racial não é afastada nos empregos de menor salário. Isto ocorre porque entre funcionários com curso superior, a faculdade e a experiência são os diferenciais para o trabalhador, enquanto que quando a concorrência é entre trabalhadores pouco qualificados não há muitas informações para servir de base de escolha, e aí pode entrar o preconceito do empregador. Por exemplo, em um processo seletivo para uma vaga de faxineiro, muitas vezes o critério da escolaridade não é utilizado. Assim, há um fator importante do capital humano a menos na seleção do empregador. Quanto menos base de escolha ele tiver, mais a sua opinião pessoal, preconceituosa ou não, pode entrar no processo.
Segregação
Na terceira parte pesquisa, buscando reduzir o problema da falta de informações qualitativas sobre o capital humano dos trabalhadores brasileiros, o pesquisador procurou estudar a segregação existente nas escolas na cidade de São Paulo. Nos bairros mais ricos é onde há uma maior predominância de apenas uma raça, contrastando, normalmente, com a região da cidade em que estão localizados. Tal resultado se explica em virtude de as escolas particulares, que se localizam em sua maioria em bairros ricos, possuírem uma maioria absoluta de brancos e amarelos, enquanto que nas escolas públicas, porém, não existe muita segregação. A maioria dos brancos, negros e pardos estudam nelas.
Imagem: Marcos Santos
Mais informações: (11) 8423-7253, email gustavo.fernandes@fgv.br , com Gustavo Andrey de Almeida Lopes Fernandes
Mais informações
Palavras chave
capital humano, desigualdade social, discriminação racial, FEA, tese de doutorado
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